Folha de S. Paulo


PM infiltrado diz que UPP da Rocinha tinha tortura de traficantes

Em depoimento aos promotores que investigaram o desaparecimento do ajudante de pedreiro Amarildo de Souza, 43, o soldado da PM Rodrigo de Macedo Avelar da Silva contou que, meses antes do sumiço, traficantes já faziam relatos de que policiais da UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) da Rocinha torturavam membros das quadrilhas para encontrar armas e drogas.

Silva atuou como agente infiltrado entre traficantes da Rocinha. Durante esse período, ouviu de criminosos descrições de como agia uma equipe da UPP, na época comandada pelo major Edson Santos.

"Ouvi diversos relatos de traficantes de que o GPP [Grupo de Policiamento de Proximidade] do Vital costumava colocar sacos na cabeça dos traficantes para que eles informassem a localização de armas e drogas", disse ao Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público, no dia 31 de outubro.

O policial Douglas Vital, conhecido como Cara de Macaco, é um dos presos sob suspeita de envolvimento com o desaparecimento de Amarildo. Vinte e cinco PMs foram denunciados e começam a ser julgados amanhã. Entre eles estão Vital e o ex-comandante Santos.

Treze PMs estão presos e respondem por tortura mediante sequestro com resultado morte e ocultação de cadáver de Amarildo; doze estão em liberdade e são acusados de omissão e formação de quadrilha.

O ajudante de pedreiro sumiu no dia 14 de julho, após ter sido levado em um carro da UPP para a sede da unidade. Na véspera acontecera uma grande operação policial na favela, a "Paz Armada", na qual 33 pessoas foram presas.

Silva desempenhara papel importante na operação. Durante quatro meses, ele trabalhou infiltrado, passando-se por um policial corrupto que aceitava propinas pagas pelo tráfico.

No depoimento, o policial infiltrado contou que o major Edson Santos ligou para o seu telefone pessoal no dia 17 de julho, três dias após Amarildo sumir, para saber o número de seu celular de trabalho.

O número era usado para conversar com os traficantes durante a infiltração e estava judicialmente monitorado. Santos disse ao policial que precisava do número para inserir em um relatório no qual pediria sua promoção.

Silva disse que até 18 de julho não sabia do desaparecimento de Amarildo e que só soube "quando recebeu uma ligação, em seu celular da ação controlada, de um indivíduo que se fez passar por um traficante, o chamou de X9 e disse que teriam matado o Boi [Amarildo] para botar em sua conta".

policial relatou que diante das notícias sobre o desaparecimento de Amarildo, desconfiou do major ter pedido o número do seu celular e chegou a pensar se estariam "armando" para ele.

Disse também que, "inicialmente, omitiu que Santos pediu o número por ter medo do que o major poderia fazer com ele, mas hoje se sente enganado e usado pelo ex-comandante".

A Folha procurou Saulo Salles, advogado do major Santos, mas não obteve retorno.


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