Gilberto Carvalho, secretário-geral da Presidência da República, afirmou que a repressão policial é combustível na fogueira dos "rolezinhos". Sua análise pode ser estendida às decisões judiciais que impediram esses eventos.
Se a gênese desses encontros em shoppings é o desejo de jovens de periferia de acessarem espaços frequentados pelas classes às quais aspiram, as tentativas de afastá-los atiça tais anseios.
Os shoppings são espaços privados, e seus gestores têm obrigações legais para com frequentadores, empregados e lojistas.
Da mesma forma, as autoridades públicas são igualmente responsáveis por garantir a segurança das pessoas e do patrimônio.
Se há delito, a polícia deve intervir e seguranças privados podem agir –e isso não é objeto de debate.
O problema surge quando esses agentes reprimem de forma desproporcional ou tentam impedir encontros de forma preconceituosa.
No caso das liminares judiciais, o argumento principal é que o shopping não é o espaço adequado para tais manifestações sociais.
Isso é verdade do ponto de vista jurídico e urbanístico. Ao mesmo tempo, os shoppings, ainda que privados, fazem as vezes de espaços públicos em um país que –por violência, negligência e desleixo– carece de espaços públicos adequados.
A Justiça acerta ao dizer que isso não transforma esses centros na arena adequada para aglomerações ou reivindicações sociais.
Se o remédio jurídico é tecnicamente correto, ele pode agravar o problema ao fazer com que tais jovens sintam-se ainda mais excluídos.
O shopping tornou-se, involuntariamente, em espelho de uma batalha social e da carência urbanística das quais até agora se beneficiava.
Mas tudo isso são sintomas e paliativos que apenas conturbam o debate em relação às causas: falta de planejamento urbano, desigualdade e ausência de etos social que nos faça sentir parte de uma mesma comunidade.
O cenário é parecido ao das ruas em 2013: a tentativa de reafirmar a inclusão através da participação no espaço público pode se transformar em uma espiral de violência caso o poder público tome medidas que exacerbem o sentimento de exclusão.
GUSTAVO ROMANO é mestre em direito pela Universidade Harvard (EUA) e responsável pelo site direito.folha.uol.com.br