Folha de S. Paulo


Para juiz, transferência de presos do MA pode fortalecer facções

Transferir presos do Maranhão, que vive uma crise carcerária, para cadeias de outros Estados vai fortalecer e até mesmo unificar as facções criminosas que atuam hoje principalmente no Complexo Penitenciária de Pedrinhas.

Essa é a opinião do juiz da 2ª Vara de Execuções Penais de São Luís (MA), Fernando Mendonça. O envio de detentos para unidades prisionais federais está previsto no plano emergencial anunciado nesta quinta-feira (9) pelo ministro José Eduardo Cardozo (Justiça).

"Sou contrário a qualquer transferência. Não tenho condições de vetar, pois são dezenas de presos de diversas varas criminais, e duas varas penais. Mas a transferência favorece a saída de presos que muitas vezes não têm nenhum contato com organizações criminosas, e acabam recrutados", afirmou.

Em Pedrinhas, 62 presos morreram desde o ano passado. Como mostrou vídeo divulgado pela Folha, três deles foram decapitados.

No início desta semana, o governo maranhense anunciou que aceita a oferta da União para transferir presos para penitenciárias federais. Apesar do anúncio, o secretário de Justiça e Administração Penitenciária do Maranhão, Sebastião Uchoa, disse não acreditar que a transferência bastaria para solucionar a crise de segurança pública enfrentada pelo Estado.

O juiz do Maranhão diz que a grande preocupação é que a ida de líderes de facções rivais para fora do Estado possa fazer com que eles voltem unificados.

'MÁFIA DIVIDIDA'

Mendonça, 59, cita o filósofo Nicolau Maquiavel (1469-1527) para justificar a declaração. "Pensando como Maquiavel, é mais fácil reinar sobre uma máfia dividida. [Agora], Se você tem várias facções, é mais fácil controlá-las do que se tiver apenas uma única facção."

O juiz do Maranhão atua na questão penitenciária há mais de uma década. "Eu vi tudo acontecer. Até 2007, meados de 2008, nós não mandávamos ninguém para fora [do Estado]. Assim, eles não tinham possibilidade de receber influência de fora. Já existiam facções no Maranhão, mas elas não tinham capacidade de liderança", afirma.

"Fora do Maranhão, os detentos podem ser obrigados a se unificarem por força de organizações nacionais. E esse pessoal passaria a ter mais dinheiro, mais armamento e capacidade operacional maior", diz.

Entretanto, Mendonça admite que dificilmente conseguiria impedir as transferências dos presos. "Todos nós aqui somos contra. Mas é difícil dizer que vamos vetar, impedir isso, pois a população quer, o Ministério da Justiça quer. Mas o que não se sabe é que daqui a três meses eles voltarão piores."

Uma alternativa para as transferências, segundo o juiz, seria a utilização de espaços que serviriam de isolamento para os detentos considerados mais perigosos. "Mas o próprio Estado admite sua falência, admite que não conseguiriam fazer isso. Há um espaço usado na Polícia Militar que foi destinado a presos após rebeliões anteriores, mas mesmo lá dentro foi constatado que entravam armas, dinheiro e celular."


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