Folha de S. Paulo


Nos anos 20, SP já projetava área verde

Qual é o programa para hoje? Uma das opções é fazer um passeio pelo exuberante parque D. Pedro 2º, na região central. Outro destino interessante pode ser as incríveis alamedas do parque do Anhangabaú, também no centro da cidade, ao lado do ainda novo Municipal.

Há 85 anos, o paulistano realmente poderia escolher com base no cardápio acima. E havia ainda outras opções perto do centro da cidade.

Na segunda metade dos anos 1920, o mundo fazia a transição do cinema mudo para o falado, assistia a exposições dos surrealistas e a expressão "art déco" era a grande novidade do momento.

Hitler começava a organizar o partido nazista. E o crash da Bolsa de Nova York, em 1929, acabaria com a efervescência do período.

Em São Paulo, no mesmo período, a população que detinha o poder neste canto do mundo sonhava com áreas verdes como as de Paris. Elas saíram do papel, mas não sobreviveram mais do que algumas décadas.

O surgimento das áreas verdes era fruto da passagem de urbanistas europeus pela cidade. O destino final deles, na verdade, era a sempre "europeia" Buenos Aires.

O plano de Joseph Bouvard, por exemplo, era ambicioso. Tal qual ele foi apresentado à Câmara de São Paulo em 1911, previa a criação de três grandes parques: D. Pedro 2º, Anhangabaú, ambos na região central, e Floresta (mais ou menos onde fica a ponte das Bandeiras, sobre o rio Tietê).

Essas áreas seriam ligadas por vias arborizadas, como a Tiradentes e rua das Palmeiras, até uma grande praça em Higienópolis (atual Buenos Aires) e ao Trianon (atual Siqueira Campos, na Paulista).

Bouvard também projetou mudanças em vias de trânsito, no centro da cidade.

A justificativa para tais medidas, como anunciou o próprio Bouvard há mais de cem anos, era uma só.

"Mais a população aumentará, maior será a densidade de aglomeração, mais crescerá o número de construções, mais alto subirão os edifícios, maior se imporá a urgência de espaços livres e praças públicas, de 'squares', de jardins", disse Bouvard.

Sobre os três grandes parques, de forma específica, a explicação do urbanista francês seguia a mesma lógica.

"Lugares de passeio para os habitantes, foco de higiene e de bem-estar, necessários à saúde pública, tanto moral quanto física."

Quem revisitar os três lugares hoje, onde deveriam existir três grandes parques, não verá nesses pontos nenhum foco de higiene.

Apesar do debate atual por uma cidade mais verde, São Paulo teve essa oportunidade no século passado.

"Sem dúvida, aquele projeto [de Bouvard e outros nomes] perdeu totalmente para o carro ao longo do tempo. Houve um grande prejuízo urbanístico", diz Vladimir Bartalini, professor da FAU/USP.

O parque D. Pedro perdeu para os viadutos que começaram, ali, nos anos 1960.

No Anhangabaú, a área livre ainda existe, mas, do projeto original, restam apenas as alamedas da praça Ramos. E, no parque da Floresta, passa a poluída e congestionada marginal Tietê.


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