Folha de S. Paulo


15 ex-integrantes do Fora do Eixo assinam manifesto contra 'arranjos sexistas' da rede

Quinze ex-integrantes de casas e coletivos que compõem a rede Fora do Eixo divulgaram hoje na internet o manifesto "Fora do Eixo e uma reflexão das mulheres contra o patriarcalismo", focado em práticas perpetradas pela rede que, segundo eles, levantam questões de gênero.

O manifesto vem a público no dia de abertura oficial da 9ª Marcha Mundial das Mulheres (MMM), que reúne mais de mil ativistas feministas de cerca de 40 países no Memorial da América Latina, na capital paulista.

Segundo a Folha apurou, o texto foi produzido para que fosse assinado apenas por mulheres, mas acabou sendo aberto para subscrição de homens ex-integrantes dos coletivos da rede.

O manifesto foi assinado por mulheres que viveram nas casas Fora do Eixo Anápolis, Minas, Nordeste, São Carlos e São Paulo.

Entre as críticas contidas no manifesto estão o suposto sexismo nas relações de trabalho dentro dos coletivos (mulheres "tendem a estar em núcleos de "enraizamento" (fixos) cujas relações se dão dentro do seu ambiente/moradia" enquanto homens "possuem uma dinâmica ativa e articulam as ações e projetos que vão sustentar o coletivo, numa relação que acontece fora daquela comunidade"), o "uso político" do sexo no FDE ("É debatido o perfil do futuro integrante ou colaborador e quais membros teriam afinidade de atraí-lo e iniciar com ele ou ela um relacionamento amoroso e/ou sexual com a finalidade de cooptá-lo") e o fato de casais serem vistos como "formação de bancadas".

Leia a íntegra do manifesto aqui

Desde o final de julho, a rede de coletivos --que surgiu em 2006 em Cuiabá (MT), liderada por Pablo Capilé, 34-- tem sido alvo de críticas e de acusações por parte de ex-integrantes desde que seu braço de comunicação, a Mídia Ninja, se projetou durante as manifestações de junho e acabou no centro da bancada do programa "Roda Viva", da TV Cultura.

Em textos divulgados nas redes sociais, esses ex-integrantes acusam a organização de agir como uma "seita" e de promover uma escravidão "pós-moderna" por não remunerar artistas em eventos que são patrocinados com dinheiro público.

Um dos depoimentos mais fortes é o da jornalista Laís Bellini, que morou no ano passado na principal casa da organização, no centro de São Paulo. Ela chama Capilé de "rei" de uma "ditadura monárquica" que promove o "escravismo mental e financeiro". Ela ainda critica o que chama de práticas sexistas dentro da rede.

Membros do Fora do Eixo não foram localizados pela reportagem.

No dia 10, Pablo Capilé, afirmou à Folha que a casa é aberta. "Isso é invenção, não existe uma orientação por parte do movimento sobre com quem as pessoas têm de se relacionar."

ORIGEM

O Fora do Eixo (FDE) foi fundado em 2006, em Cuiabá (MT), por um grupo liderado por Pablo Capilé, 34, que reunia jovens ligados à cena musical independente que pretendia dar voz a artistas de fora do eixo Rio-São Paulo.

De lá para cá, a rede cresceu de meia dúzia de coletivos espalhados por lugares com Acre, Mato Grosso e interior de Minas Gerais para dezenas de coletivos sediados inclusive dentro dos eixos, em capitais como São Paulo e Brasília. Ampliou também sua atuação de meramente cultural, com a produção de festivais de música em todo o país, para política: durante a gestão da ex-ministra da Cultura Ana de Hollanda, integrantes dos coletivos FDE se empenharam em uma campanha que reverberou nas redes sociais, pedindo o afastamento de Ana.

ASCENSÃO

Hoje, seus membros são recebidos pela ministra da Cultura, Marta Suplicy, pelo secretário de Cultura de São Paulo, Juca Ferreira, e até pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Durante as manifestações de junho, a rede ganhou nova projeção quando o projeto de mídia independente Mídia Ninja criou uma cobertura ousada dos protestos, com transmissões longas, em tempo real, narradas de dentro das manifestações.

Alçado à fama pelas transmissões via satélite, mas também por sua participação no programa "Roda Vida", da TV Cultura, o Fora do Eixo passou a ser alvo de críticas e acusações de ex-integrantes e ex-colaboradores.


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