Folha de S. Paulo


Peça solta e excesso de peso contribuíram para queda de avião no Recife

Uma sucessão de falhas mecânicas e humanas contribuiu para a queda de um avião e a consequente morte de seus 16 ocupantes em 13 de julho de 2011, no Recife, segundo o relatório final do Cenipa (Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos) divulgado nesta sexta-feira (19).

Uma peça do motor, reaproveitada de outra aeronave, se soltou; havia divergências em documentos sobre como proceder em caso de emergência; o avião estava 72 kg mais pesado que o limite máximo e os pilotos não tiveram treinamento adequado.

Segundo o coronel Fernando Camargo, responsável pela investigação, houve tensão na cabine do avião e divergências entre piloto e copiloto sobre como agir para salvar o avião.

Ele disse ainda que uma das 55 palhetas do motor esquerdo do avião rompeu, soltou-se e danificou as demais.

A peça foi fabricada em junho de 2000, e dois anos depois foi instalada em uma aeronave russa. Em 2011, o fabricante do motor testou as palhetas e reaproveitou 51 peças no avião da Noar.

Segundo o Cenipa, a peça estava dentro do prazo de validade. Das 1.996 horas de uso, apenas pouco mais de 21 horas foram no avião da Noar. A perícia não identificou o motivo do desgaste da peça.

A investigação também apontou divergências entre o check-list de emergência e o manual de voo.

Constatou ainda que o avião estava 72 kg mais pesado do que o limite máximo. O Cenipa não descartou a possibilidade de o sobrepeso ter sido causado por excesso de bagagem, mas disse haver outras possibilidades.

O coronel disse também que houve falha no programa de computador que calcula o peso do avião.

Além disso, o Cenipa apontou que o treinamento do piloto Rivaldo Paurílio e do copiloto Roberto Gonçalves foi incompleto.

O centro de investigação disse que eles foram treinados para agir, em uma situação de emergência, numa altura de até 400 pés (121,92 m), mas o fabricante afirma que o treinamento não deve ser feito abaixo de 1.500 pés (457,2 m).

INQUÉRITO

A investigação do Cenipa não aponta culpados, o que será feito pela Polícia Federal, que deve concluir seu inquérito até o fim deste ano.

A partir de seu relatório, o Cenipa faz uma série de recomendações aos fabricantes do avião e do motor e à Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), criticada tanto pela Noar quanto pelos parentes das vítimas.

Os familiares dizem que a Anac inspecionou a aeronave um mês antes do acidente e não encontrou irregularidades. Três dias depois da tragédia, foram detectadas 148 infrações.

"Soubemos aqui que as inspeções da Anac são feitas por amostragem. Mas todos nós precisamos de procedimentos que deem segurança a nós, que somos passageiros", disse Taciana Guerra, mãe do dentista Raul Farias, 24, morto no acidente.

Depois de receberem a documentação do Cenipa, as famílias pretendem sugerir outras recomendações.

O comandante Ricardo Miguel, piloto e porta-voz da Noar, contestou a investigação do Cenipa, atribuiu a responsabilidade do acidente às fabricantes do avião e do motor e à Anac e disse que o treinamento dos tripulantes não foi incompleto.

O piloto também disse que a documentação de seus colegas e da aeronave estava em ordem.

Para ele, a Noar errou apenas na escolha da aeronave. "Nós estamos condenando esta aeronave, tanto que nós perdemos a confiança. Não vamos voar esta aeronave. É uma aeronave que não era para estar aqui com a gente", afirmou.

A Anac informou ainda que "inspeções com metodologia de coleta de dados por amostragem são comuns em todos os segmentos fiscalizados e regulados no Brasil e no mundo, tendo em vista o grande universo das atividades e ações a serem fiscalizadas" e que, após o acidente, analisou todos os registros da empresa.

O ACIDENTE

O avião saiu do Recife com destino a Mossoró (RN), mas caiu cerca de três minutos após a decolagem em um terreno baldio em Boa Viagem, zona sul do Recife.

Após o acidente, a Noar Linhas Aéreas teve suas atividades suspensas.

A empresa ainda não sabe se vai retomar as atividades. Ela possuía duas aeronaves LET-410. O avião que sobrou está sendo negociado com um comprador da África.


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