Folha de S. Paulo


Brasileiros levam protestos a praças de Paris, Nova York e Madri

Em ruas e praças de Nova York, Paris e Madri, brasileiros se reuniram em protestos solidários às manifestações que ocorrem no país.

Mesmo depois de ter sido cancelada por organizadores pouco antes do horário marcado, a manifestação parisiense reuniu centenas de pessoas na tarde deste sábado na praça Nation, no leste da capital francesa. O ato tinha mais de 7.000 adesoes no Facebook.

A jornalista Beatriz Barbosa, 36, disse que não fazia sentido apoiar protestos que, segundo ela, foram "sequestrados pela direita no Brasil".

O cancelamento, entretanto, não surtiu efeito, porque às 17h (meio-dia em Brasília), a multidão começava a se aglomerar na praça. O ato durou três horas.

Como o que vem ocorrendo no Brasil, os manifestantes apresentaram reivindicaçoes difusas: desde os pedidos de melhoria na qualidade do transporte público até as críticas contra a corrupção e os gastos com obras da Copa do Mundo. Entre 900 e mil pessoas participaram do ato, segundo a polícia francesa.

Rachados, os grupos se enfrentavam com palavras de ordem: "O Brasil é campeão, mas sem corrupção", gritavam alguns. "Vaza, reaça, desta praça", respondiam simpatizantes de partidos de esquerda. Um dos grupos começou a gritar "Fora, Dilma" e foi vaiado pelos antagonistas.

"Estamos aqui muito perto da praça da Bastilha [símbolo da Revolução Francesa, de 1789]. É muito importante estar aqui porque esta imagem aqui mostra para o mundo que o Brasil também quer fazer sua mudança", disse o advogado Gil Vicente Gama, 49, que mora na Suíça e viajou a Paris para participar do protesto.

A tropa de choque da polícia francesa acompanhou a movimentação de perto, mas não houve incidentes.

As agressões a militantes de partidos políticos que aconteceram na última quinta (17) ecoaram na praça: "O que aconteceu foi muito grave. O antiparditarismo no Brasil parece quase fascista", disse Jane Barbosa, 36, que faz doutorado em geografia na Universidade Sorbonne e é filiada ao PC do B.

Empunhando um cartaz que dizia "Meu partido é o Brasil", o produtor musical Thiago Lima, 28, também condenou a agressão a militantes, mas disse que considera "inadequada" a participação de partidos nos protestos.

À esqueda, o receio é de que o movimento contestatório seja recuperado por grupos reacionários. "Os simpatizantes de esquerda no Brasil estão andando no fio da navalha. Estamos descontentes, mas não queremos que nossas críticas sejam cooptadas por grupos reacionários", afirmou o professor universitário e filósofo Charles Feitosa, 48.

O francês Jean-Pierre Guis, vereador pelo 12º distrito de Paris e coordenador de um grupo de trabalho sobre o Brasil, concorda. Ele chegou mesmo a pedir a outros manifestantes que guardassem um cartaz onde estava escrito "Fora Dilma". "A Dilma foi a única presidente que mandou embora sete ministros em seis meses", completou.

MADRI

Na capital espanhola, cerca de 500 pessoas atenderam à convocação feita nas redes sociais pelo movimento Democracia Não Tem Fronteiras.

O ato aconteceu numa das principais praças da cidade, a Espanha, na região central. Não houve confusão, mas uma equipe da SporTV foi impedida por alguns manifestantes de gravar reportagem no local.

O protesto já havia sido adiado por falta de autorização da polícia local, mas a organização insistiu na manifestação após um princípio de desistência em Paris. A permissão foi finalmente dada, e a marcha espanhola seguiu seu rumo.

Integrantes do movimento espanhol dos indignados, que há dois anos tomaram as praças e ruas da Espanha em protestos que duraram quase dois meses, foram ao ato dar apoio formal e conhecer as reivindicações.

Como no Brasil, os protestos de 2011 na Espanha eclodiram depois de ganhar força pelas redes sociais e levaram milhões de pessoas às ruas.

"Com o desemprego alto aqui, as pessoas aqui estão muito iludidas com o Brasil. Por aqui não se fala dos problemas do pais", disse o açougueiro espanhol Miguel Angel Rios, 42, que foi à manifestação. "Esses protestos nos surpreenderam."

A maioria dos participantes, no entanto, era de brasileiros residentes na capital espanhola, como estudantes, professores e advogados. Sob vigilância da polícia, eles deram uma volta na praça, cantaram o hino nacional e depois se dividiram em grupos para discutir pautas de reivindicações e como os brasileiros fora do país poderiam ajudar.

"Muita gente aqui vai voltar ao Brasil por causa da crise, e é importante que saibam o que está acontecendo", disse uma das organizadoras do protesto, Ellen Carvalho.

Na semana que vem, o grupo participará de um ato do movimento dos indignados espanhóis em Madri para explicar as manifestações no Brasil e as principais reivindicações delas.

"OCCUPY"

Em Nova York, o terceiro ato de apoio aos protestos brasileiros aconteceu pela primeira vez no Zuccotti Park, praça do centro financeiro da cidade, que abrigou o acampamento do Occupy Wall Street em 2011.

A presença do Brasil era vista como "simbólica" no espaço de um movimento que se tornou histórico por ter tomado as ruas nos Estados Unidos para contestar o capitalismo. Hoje, o parque abriga as manifestações de turcos e gregos moradores de Nova York, também presentes no evento brasileiro.

"Vejo semelhanças entre os dois movimentos no surgimento espontâneo e na multiplicidade de demandas", disse Bob Pfefferman, sindicalista ligado ao Occupy, que participou do ato.

"Estamos usando o Zuccotti porque é um local politizado. As comunidadades grega e turca daqui têm um sentimento parecido, pois seus países também estão vivendo processos políticos intensos, cada um com sua conjutura diferente", disse a brasileira Vanessa Zettler, que atuou na liderança do Occupy e agora é uma das que puxam o coro nos encontros brasileiros em diferentes pontos da cidade.

"Uma convergência é a repressão policial", afirmou Zettler, que chegou a ser detida pela polícia de Nova York nos movimentos locais há dois anos.

Na tarde deste sábado, ela traduzia para cerca de 200 jovens brasileiros as orientações judiciais de um americano sobre como se comportar em caso de prisão durante a marcha que planejam para os próximos dias.

Além dos cartazes manufaturados que faziam menção aos três países e aos protestos americanos, foram distribuídos adesivos que colocavam, lado a lado, as bandeiras do Brasil e da Turquia.

NOVA ZELÂNDIA

As cidades de Auckland e Christchurch, na Nova Zelândia, também sediaram manifestações neste sábado. Em Auckland, dezenas de pessoas se reuniram e explicavam, em inglês, a revolta contra o uso de dinheiro público em obras da Copa do Mundo.

No domingo (23), é a vez de Wellington, capital neozeolandesa. Estudantes programam um ato em frente à embaixada brasileira.

Veja vídeo

Calculada em 4.600 pessoas, a comunidade de imigrantes brasileiros na Nova Zelandia é, em geral, oriunda de uma classe media cansada dos problemas sociais.

"A orientação do Itamaraty é clara: o governo está aberto, e estes são sinais de democracia, de que eles precisam ser ouvidos", avaliou o embaixador brasileiro na Nova Zelândia, Eduardo Gradilone.

O diplomata diz estar aberto a receber os manifestantes. "Mas obviamente não irei, já que também somos governo Dilma."

"Chegou a hora de o país acordar. Uma minoria tenta prejudicar a credibilidade com depredações, mas este é um momento histórico em que o Brasil deixa de assistir passivamente À precariedade da educação, dos hospitais e o descaso com a corrupção, e vai às ruas", avalia a bacharel em direito brasileira Raquel de Bittencourt, 26 anos, moradora de Mount Cook, Wellington.
Zelândia

Mais de 2.300 perfis no Facebook confirmaram presença nos protestos nas tres principais cidades neo-zelandesas. Na última terça, em Sidney, cerca de 500 brasileiros e australianos realizaram uma manifestação no Hyde Park. Dublin chegou a reunir mais de 1,5 mil pessoas no último final de semana.


Endereço da página:

Links no texto: