Folha de S. Paulo


Projetos de 'nu verdadeiro' atraem mulheres em busca da beleza natural

Difícil calcular quanto tempo a designer Fátima Frazão, 27, já passou na frente do computador para transformar modelos naturalmente bonitas naquilo que elas não são: perfeitas.

Faz parte do trabalho, mas ela está longe de concordar com isso. Neste mês, Fátima resolveu dar o troco. Procurou uma fotógrafa que havia lhe falado sobre um tal "nu verdadeiro", sem nenhum tipo de retoque, e tirou toda a roupa.

"TV Folha" acompanha ensaio fotográfico que mostra o "nu orgânico"

O motivo? A afirmação do seu corpo e o desejo de "estar do outro lado". "A manipulação da imagem para atingir a beleza irreal é uma mutilação da mulher", reclama.

Satisfeita com o resultado, Fátima não vai deixar as fotos no fundo de uma gaveta. Elas estão na internet e, assim como ela, cada vez mais mulheres se interessam em posar nuas, desde que sem retoques.

Pouco importa que dobrinhas, marquinhas ou estrias fiquem à mostra. A ideia é que "seja de verdade" e que o Photoshop passe longe das fotos.

Sites como o Apartamento 302, do fotógrafo Jorge Bispo, (apartamento302.tumblr.com ), Nu Real (nureal.com.br ) e o The Nu Project (thenuproject.com ), do americano Matt Blum, são alguns exemplos de projetos de "nu verdadeiro".

Nenhum deles paga nada para as modelos. Tampouco cobram pelas fotos. A procura é espontânea. "Já temos cerca de 200 mulheres inscritas", garante Wagner Nogueira, criador do Nu Real.

A Folha acompanhou um dia de sessões de fotos do site. Algumas chegam tímidas, outras decididas. No caso da atriz Carolina Costa, 32, foram necessárias quatro doses de martini para se soltar.

Com cerca de 1,70 m, ela já pesou 100 kg. Hoje, quase 30 kg mais magra, não tem vergonha das estrias que lhe restaram. "Nem todas têm que ser a Gisele Bündchen", diz.

Advogadas, administradoras, atrizes e designers, não há nada em comum entre elas.

No mesmo dia da sessão de fotos de Carolina, a terapeuta tântrica Gabrielle Carla Dal Piva, 26, decidiu se dar uma segunda chance. Com 1,58 m e 59 kg, ela não está exatamente fora dos padrões de beleza, tanto que já posou para o site de uma revista masculina.

Achou que seria "o máximo". Não foi. "As fotos ficaram lindas, mas eu parecia uma boneca. Esse modelo [de beleza] é mentira", afirma, com uma timidez surpreendente, a descendente de japoneses de voz quase inaudível.

mulheres de verdade

Completamente diferente de Gabrielle é a designer brasileira T.M., 30, que posou há três anos para o The Nu Project. Com uma beleza exótica, tatuagens e quase nada de timidez, ela se sentia fora do padrão admirado pelos homens.

"Foi justamente aí que me identifiquei com o The Nu Project. Aquelas mulheres não eram o padrão de beleza 'comercial de cerveja'. Eram como eu, com cicatrizes, tatuagem, esquisitas, mas lindas... mulheres de verdade."

É essa percepção que também atrai mulheres com uma posição política clara, a de se expor para afirmar a beleza natural do corpo feminino.

"Apenas quero fazer nus da maneira que acredito. Mas ouvi alguns relatos de meninas que posaram nesse sentido [político]", diz o fotógrafo Jorge Bispo, cujo trabalho deve virar livro. "Isso e a vaidade são dois dos motivos principais que fizeram as mulheres virem ao Apartamento 302."

Para Katy Kessler, editora do The Nu Project, o objetivo é "mostrar que há beleza em cada corpo". "Não é político, ou pelo menos não começou assim. Se as pessoas querem torná-lo político, isso é com elas", disse, por e-mail, à Folha.


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