Folha de S. Paulo


Defesa de Bola usa jornalista absolvido para desacreditar delegado

Buscando desacreditar o trabalho da Polícia Civil no caso Eliza Samudio, a defesa do ex-policial Marcos Aparecido dos Santos, o Bola, usou neste terceiro dia de julgamento o depoimento de José Cleves, um jornalista que foi indiciado por assassinato pelo delegado Edson Moreira, em 2000, e absolvido seis anos depois pela Justiça.

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Foi Moreira, atualmente vereador em Belo Horizonte, quem presidiu o inquérito sobre a morte de Eliza, a ex-amante do goleiro Bruno Fernandes. Bola foi denunciado por matar e ocultar o corpo, nunca encontrado.

Foi também Moreira quem conduziu o inquérito que apontou o jornalista como autor do assassinato da própria mulher, Fátima Aparecida de Abreu, após simular um assalto.

Cleves foi absolvido pelo Tribunal do Júri de Belo Horizonte por unanimidade e escreveu um livro contando toda a história. Ele disse que o assalto ocorrido e a identificação dos autores nunca foram apurados pela polícia.

No seu depoimento, ele disse que, dois dias depois do assalto, a polícia disse ter encontrado o revólver do crime, a 50 metros do local. Cinco dias depois, ele foi indiciado, com o argumento de que comprara a arma de um policial militar, por meio de um amigo. "Eu nunca usei arma", afirmou.

Segundo ele, laudo pericial indicou depois que a bala retirada do corpo da sua mulher não era a mesma da arma atribuída pela polícia.

O jornalista, que trabalhava como repórter policial do jornal "Estado de Minas", foi questionado pelo advogado Ércio Quaresma se fazia reportagens sobre desvio de conduta de policiais. Ele disse que fazia reportagens "de interesse público".

Entre essas apurações, disse, estavam investigações sobre o envolvimento de policiais civis e militares com caça-níqueis e sobre o comércio ilegal de armas.

RELATÓRIO

Cleves disse que o delegado Moreira enviou um relatório de conclusão do inquérito ao chefe dele no jornal em que trabalhava. Ele afirmou que não tinha conhecimento se aquele era um "procedimento comum" do delegado.

Ele, contudo, não acusou responsabilizou Moreira diretamente. Questionado pela promotoria, fez duas conjecturas. A primeira foi que o delegado não sabia que a arma foi plantada "por um grupo", mas que Moreira tinha a obrigação de pedir exame de balística.

A segunda foi dizer que "o delegado não sabia que havia armação, mas que havia um grupo dentro da polícia" interessado em plantar a prova.

IMPRENSA

Quaresma também questionou Cleves sobre a postura da imprensa na cobertura do caso. Ele disse: "Acredito que o que foi publicado pela imprensa não foi por dolo [intencional], mas por repetir o que a polícia estava dizendo".

Ele disse, por exemplo, que Moreira declarou à imprensa ter sido encontrado resíduo de pólvora no seu braço, o que não ficou provado nos laudos da perícia.

O objetivo dos questionamentos sobre a imprensa foi tentar passar aos jurados a ideia de que, no caso de Bola, a imprensa também se limitou às informações oficiais. A defesa de Bola tem dito que esse é um caso "midiático" e que, nesse caso, a população é muito influenciada pela imprensa.

Exibindo o livro escrito por Cleves, Quaresma encerrou seus questionamentos recomendando a "todos os jornalistas" a leitura da obra "para ter um pouco mais de decência".


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