Folha de S. Paulo


Chile vive revolução gastronômica, diz chef premiado da América Latina

Luis Andres Henao/AP
Rodolfo Guzmán, cujo restaurante, Boragó, ficou com o posto de segundo melhor da região na premiação The World's 50 Best Restaurants
Rodolfo Guzmán, cujo restaurante, Boragó, ficou em segundo lugar no 50 Best América Latina

Até pouco tempo atrás, a ideia de ir ao Chile por sua gastronomia não passava pela cabeça de ninguém. Mas, hoje, o país conta com um dos melhores chefs da América Latina, Rodolfo Guzmán, cujo restaurante, Boragó, ficou com o posto de segundo melhor na premiação regional dos 50 melhores restaurantes, organizada pela revista britânica "Restaurant".

Guzmán se inspira nos mapuche, povo originário do Chile, para apostar nos produtos regionais e elaborar pratos que, embora simples na aparência, são produto de anos de experimentos no laboratório de seu restaurante, situado em uma das zonas mais exclusivas da capital chilena.

"Não inventamos nem descobrimos nada. A única coisa que fizemos foi resgatar o que já havia ao nosso redor", disse o chef, que conta com uma rede de 200 fornecedores por todo o país, encarregados de recolher o que a terra e o mar produzem em cada estação. Além disso, ele criou "campos biodinâmicos", onde são ordenhadas as vacas que produzem o leite consumido por seu restaurante e são cultivados vegetais que há pouco tempo só nasciam na natureza de forma espontânea.

A filosofia do chef chileno, que se formou nos fogões de Andoni Luiz Aduriz, do restaurante Mugaritz –localizado no norte da Espanha e considerado um dos melhores do mundo– é ir à campo "e pegar o que há no momento", como faziam os mapuches.

Enquanto o salão de seu restaurante esteve quase vazio durante os primeiros dez anos, ele se dedicou com perseverança e com a convicção de alguém pronto a conhecer e experimentar cada produto para conseguir sabores únicos.

"Nós, cozinheiros, somos artesãos e respondemos à intuição. Trabalhamos como biólogos, antropólogos, botânicos. Somos pessoas muito pacientes e com vontade de aprender", disse o ourives da cozinha. Com seus 38 anos, Guzmán assegura que é possível criar um prato "em um, três ou quatro anos –ou em um dia."

SANTIAGO GASTRONÔMICO

A paciência e humildade deste jovem simples –e até um pouco tímido– de grandes olhos azuis está longe da imagem que as pessoas costumam ter de um chef da velha escola, que ameaça de perto a supremacia da gastronomia peruana.

Guzmán já desbancou um dos mais ilustres restaurantes: Astrid y Gastón, do lendário Gastón Acurio, que volta a tomar as rédeas da cozinha a partir de abril. Ao lado de casas como Central, de Virgilio Martínez e Pía León, segue fazendo de Lima um dos principais destinos gastronômicos do planeta.

Ser celeiro de jovens cozinheiros –que já passaram pelos fogões do Boragó e agora estão traçando seu próprio caminho– fez com que Santiago se convertesse em um dos cinco destinos gastronômicos mais recomendados neste ano, junto a Seul, capital sul-coreana, a Sidney, na Austrália, à espanhola San Sebastian e à mexicana Valle de Guadalupe.

"O Chile está vivendo uma revolução gastronômica", disse Guzmán. "A comida é uma forma muito fácil de entender um país e o que há por trás de um território", disse o chef.

Ainda assim, para ele, a "cozinha chilena ainda não existe e está sendo construída". Para isso, ele confia nos cerca de 750 tipos de algas que povoam as águas frias dos mais de 4.000 quilômetros da costa do país, nas halófitas–uma espécie de vegetal "suculento" que é uma mescla entre alga e planta–, e nos produtos endêmicos que a variada e rica terra chilena oferece.

Por isso, o Chile tem "uma das maiores despensas endêmicas da terra", começando pelo arquipélago de Juan Fernández, que comporta uma biodiversidade sem igual.

Além do já conhecido vinho local, as autoridades chilenas apostam nesta revolução gastronômica para atrair o turismo e convertê-lo em um motor da economia do país.


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