Folha de S. Paulo


CRÍTICA

Pequeno restaurante Caxiri realça sabor da Amazônia com delicadeza

Uma bebida indígena derivada da mandioca, esta musa que Câmara Cascudo batizou de "rainha do Brasil", nomeia um minúsculo restaurante aberto em Pinheiros há três meses, o Caxiri.

A mandioca surge celebrada ali também em frações do cardápio –enxutíssimo, com três opções de prato no jantar (mais porções para compartilhar) e um no almoço, rotativo, feito com o que se pinça de mais fresco no mercado.

Um exemplo dessa homenagem é o intenso ceviche no tucupi (R$ 32), caprichado no coentro –ame ou odeie. Aqui, o caldo da mandioca-brava, com leve dulçor e acidez reforçada pelo limão, é servido frio –em contraste com as receitas populares, como pato no tucupi, em que é quente.

No escondidinho (R$ 34), a carne de sol, macia, combinada com cebola caramelizada, chega à mesa encoberta por uma camada generosa de mandioca –até desproporcional, eu diria. Amassada grosseiramente, tem textura preservada (e dá para morder).

Em sua cozinha autoral, Debora Shornik deixa transparecer ensinamentos de Paola Carosella, com quem trabalhou ao longo de anos.
Brilha o respeito pelo ingrediente no estado bruto, com seus sabores conservados. E há ali uma delicadeza recorrente, em harmonia com o atendimento da sócia Daniela Maia –e por que não com o salão, de tijolo aparente, embalado até por Luiz Tatit?

Ambas moraram na Amazônia e, no Caxiri, proporcionam certo contato com um Brasil profundo, embora por vias contemporâneas, mas não só. O pudim de leite (R$ 12) podia chamar a atenção só pela cremosidade (sem furinho). Mas a calda densa que o envolve ganha toques de cravo e canela com puxuri –semelhante à noz-moscada.

Não passe batido pelo mojito de bacuri (R$ 15). E, se quiser mais emoção, prove a cachaça de jambu, a erva do Norte que tem a magia de causar dormência na língua. Sua flor, aliás, ainda mais potente, enriquece a amanteigada mozarela de búfala, com pimenta-cambuci assada. (LF)


Endereço da página:

Links no texto: