Folha de S. Paulo


Padeiro retoma princípios artesanais e usa levedura de fermentação natural

Atenção para a primeira lição de panificação de Didier Niepceron: "O problema do pão, em geral, é o tempo entre o momento em que ele começa a ser feito e quando ele é posto à venda".

Quanto mais demorado, melhor, explica ele. "Às vezes, em duas horas, o pão já está à venda: tem que forçar a fermentação, o pão não tem gosto de nada, só quando está quente, e olhe lá."

Aprenda a fazer um pudim de croissant ao caramelo

Não seria exagero afirmar que o pão que Didier coloca à venda, em sua recém-inaugurada boulangerie Pain à Table, na Pompeia, começou a ser feito há 15 anos.

Eduardo Kanpp/Folhapress
Didier Niepceron faz malabares com massa de pão na Pain à Table, que fica na Pompeia
Didier Niepceron faz malabares com massa de pão na Pain à Table, que fica na Pompeia

Naquela pré-história das boulangeries paulistanas, ele, então sócio da DeliParis, na Vila Madalena, ajudou a transformar em outra coisa a experiência banal do paulistano de ir até a esquina para comprar pão.

Distante da nobreza dos bairros que abrigam as novas boulangeries (Jardins, Vila Madalena, Itaim), a casa aposta na volta aos princípios artesanais, a começar pelo "levain", a levedura de fermentação natural tipicamente francesa que Didier põe em tudo o que sai do forno.

Os sócios da Pain à Table parecem ter escutado a grita em torno dos preços abusivos de São Paulo. "Dá pra ter um preço razoável." Essa poderia ser a segunda lição de panificação de Didier.

De fato, ali o quilo do pão francês sai pelos mesmos R$ 10,90 cobrados nas padarias tradicionais da região, muitas das quais se valem da onipresente pré-mistura de farinha, fermento e químicos.

A estrela da casa, os pães ao levain, saem pela metade do que é cobrado na Casa Santa Luiza (R$ 38, o quilo).

A casa também não investiu nos surrados clichês parisienses (placas de rua, cartazes, fotos preto e branco, anúncios antigos etc.): a estrela é uma bela bancada industrial de rotisseria.

Dali saem iogurtes, doces, geleias e outros produtos que Didier prepara valendo-se de sua cancha de autodidata experimentado -sua "escola" foi um estágio em uma tradicional boulangerie da família de um colega, em Paris.

A Pain à Table também serve café da manhã aos fins de semana, além de pratos no almoço e no jantar que geraram um movimento inesperado.

Ainda assim, a vocação primordial é vender pão e afins, como o pudim de croissant ao caramelo ou o "jurassien", pudim salgado de pão com vinho branco, cebolinha e queijo gruyère. Há também o "crème brûlée" com cumaru: "Tem que usar os produtos daqui, não adianta usar só amêndoas ou avelã".

LEVAIN

As propriedades digestivas e saudáveis do levain são o maior orgulho de Didier: segundo ele, a acidez do levain favorece a digestibilidade, a durabilidade e, evidentemente, o sabor. Por isso, até no croissant vai um pouco dele. Terceira lição de panificação.

Mas Didier alerta que sua arte tem tanto de ciência quanto de sorte. "Você não faz croissants iguais no deserto e em Paris. O básico da receita, a maneira de fazer, é igual", diz ele. "Mas tem uma dose de acaso."

As características do levain, por exemplo, que fermenta conforme o clima, são imponderáveis. "É uma cultura de levedura selvagem. Elas estão aqui, no ar, na farinha, na água", diz ele, sem concluir o raciocínio: apenas gesticula, como quem tenta enxergar as leveduras a seu redor, com o brilho nos olhos que só os franceses têm ao falar de microrganismos.

PAIN À TABLE
Endereço rua Coriolano 301, Vila Romana, tel. (0/xx/11) 4301-2878
Horário ter. a qui. das 11h às 21h; sex. das 11h às 23h; sáb. das 8h às 23h; dom. das 8h às 16h

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Raio-x
DIDIER NIEPCERON, 52

Nascimento
Em Créteil (região metropolitana de Paris), em 7 de novembro de 1960

Carreira
Autodidata, fez um estágio em uma padaria familiar em Paris e chegou ao Brasil em 1990. Em São Paulo, trabalhou nas boulangeries DeliParis (na Vila Madalena) e Blés d'Or (em Moema)


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