Folha de S. Paulo


Avós e netinhos

Dizem as teorias sobre a evolução (esta, um fato –mas isso é outra história) que importa para a perpetuação da espécie simplesmente se os indivíduos conseguem se reproduzir, passando seus genes adiante. Nesse caso, o que acontece depois seria biológica e evolutivamente irrelevante.

Mas estão aí nossos avós para provar que a história não é bem assim. E não se trata apenas de avós humanos. Em várias espécies onde fêmeas permanecem em bandos, avós-elefantas, avós-leoas, babuínas e chimpanzés têm oportunidade de interagir com seus netinhos.

Como o envelhecimento saudável pode ser evolutivamente benéfico, ou seja, que vantagens evolutivas ele pode ter?

Muitas, como sabe quem cresceu com avós presentes –e como sabem também os avós que têm seus netinhos por perto. Mas vou ilustrar por ora apenas com os achados do neurocientista Stephen Suomi, do Instituto Nacional de Saúde Infantil e Desenvolvimento Humano nos EUA.

Suomi aprendeu com seu orientador, Harry Harlow, que filhotes de macaco reso criados sem mãe e sem carinho crescem com um leque de distúrbios sociais e de ansiedade. Ter mãe, afinal, não é apenas ter quem alimente e proteja.

Mas, em seguida, Suomi descobriu que a introdução de macacas e macacos idosos, cuidadores experientes e carinhosos, resgatava o desenvolvimento dos bebês. Não de qualquer jeito: se o contato com os bebês era forçado, a saúde dos "avós" deteriorava. Mas, tendo a opção de ir e vir à vontade, ter "netinhos" para cuidar recuperava também a saúde física e mental dos macacos idosos –e alguns até se tornaram pais novamente!

Avós voluntariamente carinhosos, portanto, ajudam não só a educar a nova geração como ainda a fazer vingar netinhos saudáveis e bem integrados socialmente –e, de quebra, os avós se mantêm revigorados por serem úteis aos netos.

Eu bem sei. Perdi minha avó no começo deste ano. Cresci ouvindo-a dizer, sempre hiperbólica, que estava à beira da morte –mas ela manteve a saúde de um touro enquanto teve netos e bisnetos por perto de quem cuidar.

Consolo-me, então, pensando não nos anos que perdemos, mas nos 40 em que tive o privilégio de crescer com uma avó que me ensinou música, tricô, costura, empadão e leite queimado; que me divertia não engolindo sapo algum e dirigindo feito uma louca até os 80 e tantos anos –e que sempre teve colo para mim e, depois, para meus filhos.


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