Folha de S. Paulo


Calma, é só a eleição presidencial

Pela primeira vez na era petista, o candidato do partido começa o segundo turno atrás do candidato tucano. Como o PT é o mais forte e mais eficiente partido brasileiro, instalado há 12 anos na máquina federal e há mais de 30 anos nos sindicatos e movimentos sociais, a disputa será intensa. Um calor que gera alguma luz, mas pode causar queimaduras.

Ao contrário da campanha tucana de 2002, debilitada pela debilidade do final do governo FHC, a campanha petista 2014, mesmo debilitada pela debilidade do governo Dilma, mostra uma disposição para a luta que empatou e radicalizou o pleito.

A pancadaria eleitoral tem aumentado o interesse e a participação dos politicamente apáticos brasileiros, o que é bom, mas conduz a extremos que podem dificultar entendimentos posteriores. Afinal, o país é muito menos dividido que os 51% a 49% das intenções de voto nos candidatos.

A divisão entre PT e PSDB não é a divisão entre direita e a esquerda nem a divisão entre pobres e ricos. A divisão entre PT e PSDB é a divisão do poder. Nisso eu concordo com Luciana Genro: há muito mais pontos que unem os dois partidos do que os separa. Tirando, claro, a luta pelo poder.

No século passado, pós-ditadura, pós-Sarney, pós-Collor, muitos lamentaram que PT e PSDB não se uniram numa única via "progressista".

Os partidos seguiram seus caminhos separados e conseguiram eleger seus melhores líderes (FHC e Lula, os pais fundadores do Brasil moderno) para presidir o país por 16 anos. Com diferentes contribuições, eles consolidaram a democracia e a economia de mercado, criando um consenso de centro e central em torno do capitalismo. Ironia do destino (e mérito do lulismo), o PT veio a ser o partido que mais capitalizou politicamente com o capitalismo nacional.

Aí veio Dilma, ungida por Lula e pelos 7,5% de crescimento do PIB de 2010, que decidiu mudar o que estava dando certo. Tomou uma curva econômica à esquerda e, na mão pesada, matou o espírito animal do empresariado, que é quem mais emprega e investe no Brasil.

O dilmo-petismo se entusiasmou com a onda (hoje marolinha) do capitalismo de Estado e tomou (só) para si a condução econômica do país, passando por cima das empresas, dos empresários e dos mercados.

O governo pode muito no Brasil, mas o setor privado é tão grande e sofisticado que ignorá-lo traz grandes perdas e danos. Os resultados foram brutais. O crescimento estagnou, as finanças públicas deterioraram, a inflação ganhou fôlego, as contas externas pioraram. O emprego ainda resiste, mas por causa de vagas mal renumeradas e de pouca qualificação.

A saída dessa crise passa pela volta ao consenso, ao entendimento com o setor privado, ao entendimento de que o Estado brasileiro é um dos maiores beneficiários do fortalecimento das empresas. São elas que geram os empregos e os tributos para as ações sociais dos governos.

A campanha de Dilma até aqui, porém, aponta para o outro lado. Diante dos ataques da oposição, defende de forma radical seu legado e opõe ricos a pobres, empresas a trabalhadores. Seria mesmo suicídio a presidente-candidata reconhecer o fracasso econômico de seu governo no calor dessa corrida eleitoral.

Tomara que seja só isso, só a campanha presidencial. Afinal, o Brasil (ainda) é maior que seu governo.


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