RIO DE JANEIRO - Velho leitor de John Buchan, Eric Ambler e John Le Carré, mestres dos romances de espionagem, sempre me achei apto a decifrar tramas envolvendo encontros escusos, transporte de dinheiro ou venda de informações, capazes de abalar o equilíbrio entre corporações ou nações. Mas talvez eu estivesse errado. A ilusão de entender aqueles enredos complicados era porque, no último capítulo, esses autores dão a solução redondinha ao leitor. Na vida real —vide o Brasil—, não é tão simples.
Um ponto em comum entre a ficção e a não ficção é a existência de um local para servir de cenário ou de motivação para os crimes. Aqui no Brasil, esses locais abundam. Podem ser tanto o sítio em Atibaia, o tríplex no Guarujá ou o apartamento vizinho com que dona Marisa insistia em mimosear Lula, que não sabia de nada. Ou o apartamento de Salvador em que Geddel Vieira Lima estocou R$ 51 milhões em malas. Ou o apartamento no Rio que Aécio Neves e sua irmã queriam "vender" para Joesley Batista por R$ 40 milhões, mas, como não precisava de apartamento, Joesley deu R$ 2 milhões assim mesmo a um primo de Aécio.
Até aí, dá para acompanhar. O problema, tanto nos enredos da literatura quanto nos de verdade, é a confusão em torno do dinheiro. Ele entra e sai da história sem que se consiga acompanhá-lo. No caso do Brasil, é a dúvida entre corrupção passiva e corrupção ativa. Quando termina uma e começa a outra?
Lula, por exemplo, vive sendo denunciado por ter recebido recursos ilegais quando era presidente, o que significa corrupção passiva. Mas alguém imagina Lula sendo passivo em alguma operação?
Se, fora do trono, ele continua a dar broncas, se achar Deus e ameaçar meio mundo, imagine como não era quando tinha a caneta na mão e a certeza de que, ungido por si próprio, sua vontade era a lei.