Folha de S. Paulo


O apogeu aos 19

RIO DE JANEIRO - "Casablanca", o filme de 1942 com Humphrey Bogart, é quase uma unanimidade do cinema — difícil encontrar quem não goste. A ação, como se sabe, se passa no Rick's, a boate-cassino em Casablanca frequentada por aventureiros internacionais, franceses colaboracionistas e os oficiais nazistas que ocupavam a região na Segunda Guerra. Há dias, morreu a última sobrevivente do elenco: a francesa Madeleine Lebeau, aos 92 anos. Tinha 19 quando fez o filme.

Seu papel era curto, mas marcante: o de Yvonne, a garota francesa que entra no Rick's de braço com um inimigo. Isso provoca uma discussão que resulta no duelo de hinos patrióticos: os alemães cantando "Die Wacht am Rhein" e os franceses, "A Marselhesa". A força deste último inflama o nacionalismo dos franceses, inclusive o de Yvonne, que chuta o alemão e grita em close "Vive la France! Vive la démocratie!".

Na vida real, Madeleine acabara de viver uma situação que parecia tirada de "Casablanca". Ela e seu marido, o ator Marcel Dalio, famoso pelo clássico "A Grande Ilusão" (1937), de Jean Renoir, tinham deixado a França pouco antes da Ocupação e se refugiado no México, onde esperaram longamente por um país que os acolhesse. Tal país foi os EUA e os dois acabaram em "Casablanca", em que Dalio interpretou (sem crédito) o crupiê do Rick's.

Depois do filme, eles se separaram. Dalio consolidou sua carreira americana e Madeleine voltou para a Europa, onde se casou com Tullio Pinelli, roteirista de Fellini em suas obras-primas dos anos 50/60, como "A Estrada da Vida", "A Doce Vida", "8 ½". Nesta última, de 1963, Madeleine contracena com Marcello Mastroianni num papel em que interpreta... Madeleine, uma atriz francesa.

Podia haver melhor papel para uma menina que conheceu o apogeu aos 19 anos e teve outros longos 73 para se lembrar disto?


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