Folha de S. Paulo


Denúncia de abuso sexual é motivada por ódio, diz religioso

Após a missa para um templo quase vazio, João Marcos Porto Maciel -dom Marcos- falou à Folha sobre as denúncias de pedofilia. Depois de três décadas de silêncio, o empresário Marcelo Ribeiro, 48, decidiu acusar publicamente o religioso de abusar sexualmente dele dos 12 aos 15 anos .

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Folha - O que o senhor tem a dizer sobre as acusações de seu ex-aluno Marcelo Ribeiro?
Dom Marcos - Ele está motivado por um grande ódio. É vingança. Vejo que se insurgiu e começou a me caluniar. Procurou colegas para aderirem. Eles disseram: 'Não. Nós nunca vimos nada disso'. Ele se confunde todo no próprio livro. Diz que foi abusado desde os 9 anos, depois aos 14. [Ribeiro diz que o assédio começou aos 9 anos, e a primeira relação sexual aconteceu aos 12 anos].

Pretende processá-lo?
Não vale a pena. É tanta bobagem e diz que diz.

E os traumas?
Ele não tem trauma porque não teve abuso. Se era abusado, por que veio comigo para o Sul? Gostou da marmelada.

E a denúncia do violoncelista Alexandre Diel à Folha?
Tem casos que não posso narrar na minha condição religiosa. Em um coral com 60 e poucos meninos acontece de tudo um pouco. Eles transformam tudo em tragédia.

Por que homens adultos estão vindo a público acusá-lo?
Porque é moda. Pedofilia dá status. Esse Marcelo escreve anonimamente para cá e me chama de "vovô gagá". O Alexandre é uma pobre alma. Cometeu erros e estragou as coisas por infantilidade.

Existe pedofilia na igreja?
Apareceu tarde a pedofilia na igreja. Com os espartanos, aos cinco anos eles tinham que levar uma surra por dia e fazer sexo com outro para aprender. Mas é uma situação delinquente. Trabalhei 50 anos com meninos e afastei os que foram pegos.

E sexo de um adulto com uma criança do coral?
Dos adultos irem pra esse lado sempre houve. Agora, com padres me chama muito a atenção. São pessoas preparadas, inclusive psicologicamente, para enfrentar o celibato. Abusar de meninos e meninas? Não vejo sentido.

O celibato é um fator?
Creio que não. Tem pastores evangélicos casados que sofrem do mesmo problema. Quando querem ser sem vergonhas, são. Nem a melhor esposa segura um homem dado à pederastia. É de época. As pessoas se depravaram.

Que conduta o senhor prega entre os seus monges?
Para entrar aqui deve ser uma pessoa preparada para a castidade. Já vieram vários que tinham maus costumes na homossexualidade. Mandou-se pra casa tão logo se descobriu. Estamos em poucos porque a maioria que quer vir para os mosteiros é dessa linha. Aqui não é casa para vir deitar com ninguém.

Que balanço faz do seu trabalho como maestro?
Pela quantidade de meninos que passaram pelas minhas mãos, uns 8.000, 10 mil meninos, acho que é muito pouca lambança isso aí. Tem um saldo muito bom. As denúncias são fichinha, em vista das coisas boas.

Marlene Bergamo/Folhapress
João Marcos Maciel em sua igreja em Caçapava do Sul (RS)
João Marcos Maciel em sua igreja em Caçapava do Sul (RS)

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A TRAJETÓRIA DO RELIGIOSO

1958
Ingresso no instituto dos Oblatos Diocesanos de Buenos Aires

1963 a 1968
Dirige o coral de Meninos Cantores da Catedral Frederico Westphalen (RS)

1969 a 1971
Estudos na Alemanha e estágios em corais europeus

1975 a 1980
Maestro do coral Os Bem-te-vis da Catedral da Sé, em Diamantina (MG), que excursiona pelo país

1981 a 1986
Regente do coral da Catedral de Novo Hamburgo

1984
É ordenado sacerdote

1998
Funda a Ordem de Santa Cecília, em Caçapava do Sul, sua cidade natal, em terreno que ganhou de herança

2009
Deixa a Igreja Católica. O mosteiro se torna Abadia Anglicana de Santa Cecília e ele, seu bispo e abade

2014
A ordem passa a se declarar "veterodoxa" e segue a doutrina do papa Gregório Magno, do século 6º


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