Rogério estava machucado e preparando sua aposentadoria no último clássico São Paulo x Corinthians de sua carreira de goleiro. Dênis estava na meta no dia do 6 x 1, em Itaquera.
Se estivesse em campo, Rogério teria sofrido o centésimo gol do Corinthians, como os corintianos adoram imaginar que sofreu.
Foram 66 clássicos em que levou 95 gols, marcou três, entre eles o centésimo, em 2011.
Rogério volta à história do Majestoso hoje como treinador. Ninguém no São Paulo queria que acontecesse o jogo na situação atual. São quatro partidas sem vencer e o risco de a pressão aumentar em caso de derrota.
Não está em risco o emprego. Rogério não é um técnico comum. Também não se trata do risco de eliminação da fase final do Paulista, torneio para o qual o São Paulo deu de ombros nos últimos doze anos, mas tornou-se importante para acabar com a seca de troféus desde 2012.
Há dois tipos de pressão. Uma é a do espelho. Rogério não se tornou técnico para fracassar. O objetivo é mais ambicioso.
A outra pressão é política e não bate na cara do treinador, mas do presidente. Leco disputará a eleição com José Eduardo Mesquita Pimenta em abril e a guerra espalha-se por disputas de números, feitos e desfeitos.
O grupo de apoio ao presidente anuncia a queda da dívida em 56%. A situação avisa que o passivo cresceu 16%.
Parece o Palmeiras de cinco anos atrás. Um grupo de oposição dizia que receita antecipada de TV fazia parte do passivo –está certo– e o apoio presidencial dizia que, por sua lógica contábil, não era, porque havia a data para o recebimento.
Está claro que o São Paulo melhorou. Esqueça a dívida e pense na receita. Um clube que fatura R$ 393 milhões por ano deve se preocupar com a dívida, mas tem condição de solucionar o problema rapidamente. Era o caso do Palmeiras quando Paulo Nobre assumiu a presidência, em 2013.
Hoje, o Palmeiras parece equilibrado e gasta muito. O São Paulo parece desequilibrado e preocupa-se em economizar. Parte da solução palmeirense e do Flamengo foi aumentar os ganhos, não apenas diminuir os gastos.
É aí que volta Rogério Ceni. Não é sua obrigação, mas sua ambição, ganhar jogos grandes e fazer o São Paulo voltar rapidamente ao patamar que tinha, quando o goleiro usava a faixa de capitão. Mas é obrigatório para o São Paulo voltar a ser um clube vencedor.
Ganhar não serve só para aumentar a receita. Serve para diminuir a desunião. Raras vezes o São Paulo esteve tão dividido. Só em 1990, a ruptura política teve tanto impacto no desempenho esportivo, a ponto de não se classificar na repescagem do Paulista e de a oposição, depois de eleita, não ter tido o cuidado de olhar o regulamento para apontar o artigo que dizia "não haverá descenso."
Na boca do povo, o São Paulo caiu. Na letra da lei, não.
Em 1990, permitir falar sobre o rebaixamento era apresentar a herança do caos. Dali para o título mundial dois anos depois e para o bi de 1993, quando já jogava Ceni.
O mito virou técnico e seu sucesso ou fracasso interferem indiretamente na política do clube. Quanto pior, pior.