Folha de S. Paulo


O partido do looping no tempo

Agora, todos que acompanham política sabem da performance falha de Marco Rubio no debate republicano de sábado (6) - eu diria um desempenho que bateu um recorde, mas isso revelaria minha idade. Ele não apenas respondeu a uma questão de Chris Christie sobre sua falta de realizações repetindo, palavra por palavra, a mesma linha de seu discurso de campanha que tinha usado um momento antes, como quando Christie zombou de seu "produto enlatado", ele repetiu a mesma linha mais uma vez.

Em outras notícias, na semana passada – no Dia da Marmota [2 de fevereiro], para ser mais preciso – republicanos da Câmara deram o que todo mundo sabia que era um voto puramente simbólico, sem conteúdo, para revogar o Obamacare. Foi a 63ª vez que fizeram isso.

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A incapacidade de Rubio de fazer qualquer coisa além de repetir seus pontos de discussão "enlatados" foi surpreendente. Pior, foi engraçada, o que significa que se tornou viral. E reforçou a narrativa de que ele não é nada além de um terno vazio. Mas, sério, será que todos em seu partido não estão fazendo praticamente a mesma coisa, talvez não tão visivelmente?

A verdade é que todo o partido republicano parece preso em um looping de tempo, dizendo e fazendo as mesmas coisas repetidas vezes. E, ao contrário do personagem de Bill Murray no filme "O feitiço do tempo", os republicanos não mostram nenhum sinal de que aprendem alguma coisa com a experiência.

Pense nas doutrinas que cada político republicano precisa agora aprovar, sob pena de excomunhão.

Primeiro, há o ritual de denúncia de que o Obamacare é uma lei terrível, muito ruim, assassina de empregos. Mencionei que ela assassina empregos? É estranho dizer, mas essa linha não mudou em nada, apesar do fato de termos criado 5,7 milhões de postos de trabalho no setor privado desde janeiro de 2014, quando o Affordable Care Act entrou em pleno vigor.

Depois, há a afirmação de que tributar os ricos tem efeitos terríveis sobre o crescimento econômico, e, inversamente, que o corte de impostos no topo da pirâmide pode contar para produzir um milagre econômico.

Essa doutrina foi testada mais de duas décadas atrás, quando Bill Clinton elevou as taxas de imposto sobre os rendimentos elevados. Os republicanos previram um desastre, mas o que tivemos foi o melhor funcionamento da economia desde os anos 1960. Ela foi testada novamente quando George W. Bush cortou impostos sobre os ricos. Os republicanos previram um "boom de Bush", mas na verdade tiveram uma expansão sem brilho seguida pela pior recessão desde a Grande Depressão. E foi testada pela terceira vez depois que o presidente Obama ganhou a reeleição, e os impostos sobre os mais ricos subiram substancialmente; desde então, criamos oito milhões de empregos no setor privado.

Ah, e há também o fracasso espetacular da experiência do Kansas, onde enormes cortes de impostos criaram uma crise orçamental sem entregar qualquer indício do milagre econômico prometido.

Mas a fé republicana em cortes de impostos como um elixir econômico universal tem, se é que tem, se tornado mais forte, com Rubio, em particular, indo ainda mais longe do que os outros candidatos com a promessa de eliminar todos os impostos sobre ganhos de capital.

Enquanto isso, na política externa, a posição necessária no Partido Republicano se tornou a de confiança absoluta na eficácia da força militar. Como isso funcionou no Iraque? Não importa: a única razão pela qual alguém no mundo não faz exatamente o que os EUA querem deve ser porque a nossa liderança é covarde, se não traidora. E a diplomacia, não importa o quão bem sucedida, é denunciada como apaziguamento.

Não por acaso, a postura republicana compartilhada em política externa é basicamente a mesma que Richard Hofstadter famosamente descreveu em seu ensaio "O estilo paranoico na política americana": sempre que os EUA não conseguem impor sua vontade sobre o resto do mundo, só pode ser porque foram traídos. A John Birch Society ganhou a guerra pela alma do partido.

Mas será que todos os políticos não jorram respostas enlatadas que têm pouca relação com a realidade? Não.

Goste você dela ou não, Hillary Clinton é uma especialista genuína em política, que é capaz de pensar rápido e claramente sabe o que está falando sobre muitos assuntos. Bernie Sanders é muito mais um candidato de uma nota só, mas pelo menos a questão que leva sua assinatura – o aumento da desigualdade e os efeitos do dinheiro na política – reflete preocupações reais. Quando você pensa sobre os debates democratas após o que aconteceu no sábado, não parece que está assistindo a um partido diferente, parece que entrou em um universo intelectual e moral diferente.

Então, como isso aconteceu com o Partido Republicano? Sendo direto, suspeito de que tem muito a ver com a "Foxificação", a forma como eleitores republicanos das primárias vivem em uma bolha de mídia na qual fatos constrangedores não podem penetrar. Mas deve haver causas mais profundas por trás da criação dessa bolha.

Seja qual for a razão crucial, no entanto, o ponto é que enquanto Rubio, de fato, caiu no ridículo no sábado, ele não foi a única pessoa no palco jorrando questões de discussão enlatadas que são descoladas da realidade. Todos eles eram, mesmo que os outros candidatos conseguissem evitar se repetir palavra por palavra.

Tradução de MARIA PAULA AUTRAN


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