Folha de S. Paulo


Dilma, o pato-manco precoce, e Obama, o anti-pato-manco

Nos primeiros cem dias de governo, o governante normalmente tem capital político para propor as reformas mais difíceis e leis mais ambiciosas. O líder acaba de sair de uma eleição e tem altos índices de popularidade, o que facilita a aprovação de medidas controversas..

Já o governante que está em fim de mandato e não pode tentar a reeleição fica enfraquecido, porque tem menos influência sobre outros políticos dado o pouco tempo que lhe resta no cargo.

Roberto Stuckert Filho - 30.jun.15/PR
A presidente Dilma Rousseff é recebida por Barack Obama na Casa Branca durante visita aos EUA
A presidente Dilma Rousseff é recebida por Barack Obama na Casa Branca durante visita aos EUA

Nos Estados Unidos, ele é chamado de lame duck (pato manco), e tradicionalmente fica esperando o tempo passar, sem conseguir fazer grandes coisas.

A presidente Dilma Rousseff e o líder americano, Barack Obama, subvertem essa lógica.

Só resta a Obama um ano e quatro meses de governo. Em fevereiro do ano que vem, com as primárias em Iowa, começa oficialmente a pré-eleição nos Estados Unidos.

Mas em vez de ter se tornado um "pato manco", Obama está mais forte do que nunca.

Desde as eleições de meio de mandato, em 2014 (em que os democratas levaram uma sova, registre-se), Obama vem empilhando conquistas.

O Obamacare vem resistindo a questionamentos na Justiça e deve entrar para a História como a maior reforma do sistema de saúde americano dos últimos 50 anos.

Tudo indica que os EUA irão celebrar a assinatura da Parceria TransPacífico, acordo comercial que reunirá 40% do PIB mundial.

Obama conseguiu normalizar as relações entre Estados Unidos e Cuba, depois de 55 anos.

O líder americano assinou um acordo climático com a China e baixou medidas para reduzir as emissões nos EUA.

Logo depois de assumir, em seu segundo mandato, aprovação de Obama era de 52,2% e sua desaprovação, de 43,1%, segundo a média das pesquisas compilada pelo RealClearPolitics.

Nesta quinta (27), a sua aprovação era de 44,3% e desaprovação, 51,7%..

O lado positivo é que o pato manco tem pouco a perder, portanto pode se arriscar mais e baixar ordens executivas (equivalentes a medidas provisórias), o que Obama fez a rodo.

Dilma, em seu oitavo mês de presidência, é um pato manco precoce —pelos piores motivos.

O nêmesis Eduardo Cunha na presidência da Câmara vem barrando todos os projetos que interessam ao governo e conduzindo à aprovação as maiores bombas, fiscais ou não.

A meta de superávit primário foi reduzida de 1,2% do PIB em 2015 para apenas 0,15%, dada a arrecadação pífia e a dificuldade do governo de cortar gastos.

Grandes bandeiras de Dilma, como Pronatec e Ciência sem Fronteiras, sofrem atrasos ou encolheram.

Só neste comecinho de governo, já houve três mega manifestações pedindo o impeachment da presidente.

O desemprego chegou a 7,5% em julho, maior índice para o mês desde 2009.

E a dívida bruta chegou a 63% do PIB no primeiro semestre.

A expectativa de mercado, segundo o último boletim Focus do Banco Central, é que a inflação medida pelo IPCA fique em 9,29% em 2015 (a meta de inflação é 4,5%, com tolerância de dois pontos porcentuais para cima ou para baixo). O PIB deve encolher 2%, segundo o mesmo boletim.

Dilma passou de 42% de aprovação logo após a eleição, em 2 e 3 de dezembro de 2014, para apenas 8% na última pesquisa Datafolha, do início de agosto.

Há muita discussão sobre a origem da expressão pato manco, que remonta ao século 18 na Inglaterra.

Mas seu significado é claro: trata-se de um pato que, por ser manco, não consegue acompanhar seu bando e se transforma em alvo fácil para predadores.


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