Folha de S. Paulo


Ajuste fiscal anticíclico

Durante dois anos e meio de governo Dilma, quase não houve debate fiscal na Esplanada. As discussões sobre o volume de economia para pagar os juros da dívida praticamente inexistiram.

As reuniões da chamada junta orçamentária, o órgão que decide quando cortar, onde cortar e como cortar gastos, funcionavam assim: duas das três pastas que integram o fórum, Planejamento e Casa Civil, diziam amém ao terceiro, o Ministério da Fazenda.

Quando algum técnico ensaiava brigar por um superavit primário menor, o titular da equipe econômica, Guido Mantega, vinha com uma frase pronta que sensibilizava os demais colegas do primeiro escalão: "vai pegar mal no mercado". E o assunto se encerrava.

Quando, em setembro de 2012, os números já confirmavam um PIB desnutrido, o então número dois da Fazenda, Nelson Barbosa, defendeu que a equipe econômica admitisse um primário menor diante do baixo crescimento. Se a economia melhorasse, o Planalto pouparia mais.

Mas não houve plateia, tampouco apoiadores. Planejamento e Casa Civil não se mexeram.

Depois daquela reunião de setembro, não consta que Barbosa tenha voltado a participar dos encontros da junta. Ao contrário, ele pediu demissão do cargo para voltar à academia.

No mês seguinte, Casa Civil e Planejamento resolveram começar a discordar da Fazenda. E o contraponto, quase três anos mais tarde (e com a credibilidade do governo na área já em frangalhos), se formou.

Hoje, as ministras Gleisi Hoffmann e Miriam Belchior não fazem outra coisa a não ser contestar Mantega. Até evitaram que o recente corte orçamentário chegasse à casa dos R$ 15 bilhões.

As meninas de Dilma queriam R$ 5 bilhões. Venceu a coluna do meio. Ou era assim, ou o ministro da Fazenda, que prometera o teto, teria de pedir demissão, desmoralizado.

O curioso é que, depois de tanto tempo sem debate, as reuniões da junta ficaram mais animadas.

Sabe o que a dupla de ministras defende lá dentro? Um "plano de ajuste fiscal anticíclico de longo prazo".

O plano é assim: o governo se compromete com um patamar de superavit x pelos próximos anos, provavelmente abaixo de 3,1% do PIB, mas mais próximo da realidade, e condiciona a meta ao desempenho da economia. Se o Brasil crescer bem, arrecada mais e poupa mais. Se derrapar na curva, dá tchau a um primário maior.

Dilma decidirá o que fazer. Enquanto isso não ocorre, Mantega tem de administrar duas vozes contrárias do outro lado da mesa.


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