Folha de S. Paulo


Itamar vai ao Senegal e ninguém pergunta por quê

Aquele leitor arguto, já citado em ocasiões anteriores, aquele que colabora em troca da clandestinidade amparada em razões consideráveis, volta à carga. Ele reclama da passividade exibida pela imprensa diante da reunião do Senegal.

Diz que o presidente Itamar, em seu primeiro lance internacional, realiza um fiasco a que a nós jornalistas apenas assistimos paralisados: "É uma pajelança cucaracha com países que não têm fronteiras com o Brasil, não têm origens comuns e nem comércio. Que raios de reunião é essa? Que prioridade?"

O leitor tem razão. A imprensa, tão exuberante em situações recentes, está bobeando ao não analisar criticamente o início da nova gestai do Ministério das Relações Exteriores: "Se o Itamaraty tivesse o mínimo de bom senso concentraria as visitas do presidente a países com que temos fronteiras e participam com volumes expressivos no nosso comércio, ou que tenham possibilidades de ter investimentos relevantes no Brasil".
Mesmo esta Folha, rápida ao identificar o populismo e o sentido descontínuo desses primeiros passos do governo Itamar, parece embotada. Nenhuma análise a respeito do novo Itamaraty. Nada que esclareça a execução da política externa na administração de Fernando Henrique Cardoso. Este, vale notar, é um senador de São Paulo, ex-colunista do jornal. Vem a ser também o nome dos sonhos de nove entre dez pessoas que se preocupam com o assunto, inclusive, é lícito intuir, boa parcela dos jornalistas.

Alguém pode perguntar por que diabos a diplomacia é relevante? Há pelo menos uma razão óbvia. O setor externo é um dos poucos que ainda seguram a economia brasileira nos últimos anos. Indefinições nessa área interessam a todos, pelo prejuízo que podem causar. Nesse quadro, há quem não consiga entender, por exemplo, como lembrou o correspondente da Folha em Washington, Carlos Eduardo Lins da Silva, que o presidente Itamar não tenha até hoje se dignado a telefonar para Bill Clinton para cumprimentá-lo pela vitória, limitando-se a uma mensagem protocolar.

Ao contrário do que ocorreu no passado, o noticiário diplomático não tem mais quase nenhuma importância na agenda da imprensa brasileira. A Folha foi quem primeiro abandonou qualquer cobertura intensa do assinto. Mesmo jornais como os centenários "O Estado de S. Paulo" e "Jornal do Brasil", que sempre procuraram se identificar com a suposta sofisticação da chacelaria, hoje trocaram-na explicitamente por temas mais mundanos. Não se deve, por isso, dar de barato, que a diplomacia de Itamar não nos afeta em nada.

GLAUCO

O leitor Edgar Helbig, de São Paulo, envia carta acompanhada de recortes de tirinhas do personagem Geraldão, de autoria do chargista Glauco, publicado regularmente na Ilustrada. Helbig não crê ser necessário que o jornal publique tais tipos de tiras, as quais, segundo ele, "nada somam à moral já existente no nosso meio".

Glauco é quase sempre engraçado, mas quase sempre avança o sinal. Em todas as tiras enviadas pelo leitor, o pênis de Geraldão está à mostra. Em geral, o personagem observa a mãe pelo buraco da fechadura do banheiro. Numa delas, o personagem segura o pênis e anuncia que vai se masturbar: "Mãe fica olhando enquanto eu mando bala".

O Brasil é hoje o país mais liberal do mundo e a Folha é o jornal mais liberal do Brasil, mas há situações que ultrapassam os extremos mais elásticos, a começar os do bom gosto.

FÉRIAS

Estou saindo de férias a partir de amanhã. O leitor pode deixar seus recados no telefone (011) 224-3896. Na volta, retornarei as ligações e responderei às cartas.

ALTA E BAIXA

ALTA para o "Jornal do Brasil" pela revelação da suposta tentativa de suborno do procurador-geral da República por um empresário de Brasília.
ALTA para o "Notícias Populares", por sua vitória no processo que pedia o envelopamento compulsório do jornal.
BAIXA para o jornal sensacionalista português "O Título", por divulgar, sem qualquer confirmação, que o jogador brasileiro Mozer, do Benfica, fora contaminado pelo vírus que causa a Aids.
ALTA para a revista "Veja", pelo publicação das revelações do ex-agente do DOI, Marival Dias do Carmo, a respeito da tortura e assassinato de presos políticos durante o regime autoritário.


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