Folha de S. Paulo


E o social?

É uma conclusão óbvia a de que o massacre do Carandiru, o arrastão nas praias do Rio, a rebelião dos menores da Febem do Tatuapé são exibições de um país que imerge numa situação social que escapa ao controle e teima em demostrar a quase total falência da capacidade de atendimento das estruturas estatais. São cenas chocantes de um desespero miserável que transborda prisões e favelas, balança a pose impassível, os devaneios de quietude da classe média e da classe empresarial.

Vamos ter que enfrentar um incômodo grande demais, que se procurava esquecer, até por um impulso saudável de autodefesa psicológica e emocional. Quem em sã consciência deseja pagar o preço para minorar o problema. Quem está disposto a pensar na sua responsabilidade individual diante do caos social. Toda a "mentalidade" nacional está voltada para uma atitude de distanciamento, que culpa os políticos corruptos e o Estado incompetente, que cabe sob medida para a acomodação. Ao lado de toda o saudável questionamento do papel do Estado no Brasil, forneceu às elites ótima desculpa para fazer o que no fundo sempre almeja, essa cômoda atitude de descompromisso diante das obrigações para o funcionamento do país.

É de se registrar que os meios de comunicação, apesar de sua eficiência na investigação no terreno das irregularidades administrativas no Collorgate compõe esse quadro de alheamento. Toda aquela energia mobilizada para tirar o presidente Collor do poder não se movimenta na hora de enfrentar temas bem mais complexos como a miséria absoluta, a situação das famílias pobres, a educação, a crise de valores na sociedade, e preparação e assistência aos policiais. Esses são temas raros na agenda da imprensa brasileira. São assuntos que não vendem muito jornal, a não ser quando estão associados secundariamente a algum derramamento de sangue.

Silenciosamente, temas como a educação, por exemplo, foram desaparecendo dos grandes jornais brasileiros. Em especial desta Folha, que chegou a ter uma editoria inteira dedicada ao assunto. O jornal não dispõe hoje sequer de um jornalista encarregado exclusivamente do tema.

Em todos os jornais, a Folha à frente, faltam recursos dedicados a uma fiscalização sistemática da atuação governamental na área dos ministérios ditos sociais, a não ser quando eles estão envolvidos em renúncias de irregularidades.

O descaso dos sucessivos governos na execução de políticas sociais eficientes merece ser criticado pela imprensa. Mas a hierarquia de prioridades do jornalismo brasileiro nesse setor tampouco serve como exemplo a ser seguindo.

ZÉ PORTUGUÊS

Como se diz, Quércia é a bola da vez. Recebi nove ligações essa semana de pessoas que exigiam da Folha a mesma determinação das denúncias das "irregularidades de Quércia" que o jornal exibiu durante o Collorgate.

Algumas dessas mensagens comparavam a Folha a "O Estado de S. Paulo". Dizem que este sim tem sido firme contra o ex-governador paulista.

O único dos leitores a divergir foi o comerciante José Nunes Lopes, amigo e sócio de Quércia. Em carta enviada na última quarta-feira, o "Zé Português", acusado de ser o PC do Quércia, queixa-se contra "alguns veículos de São Paulo (leia-se "O Estado de S. Paulo" e "Jornal da tarde". Diz Nunes Lopes: "Apesar dos meus desmentidos, estes veículos insistiram em publicar várias vezes que, pouco antes da privatização da Vasp, eu teria comprado um cheque administrativo do Citibank e o teria depositado em conta bancária de uma empresa do senhor Wagner Canhedo. Não levaram em conta as minhas declarações nem esperaram que o banco se manifestasse oficialmente".

À carta, Nunes Lopes anexou uma declaração do Citibank segundo a qual o depósito, de 4 milhões de dólares, não existiu. Resta saber a razão pela qual os jornais não informaram o teor do cominicado do Citibank.


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