Folha de S. Paulo


A linguagem de Marcelo Paiva gera protestos de pais

"Confesso que hesitei bastante antes de iniciar a redação desta carta, porque temia ser mal interpretado, porém o sentimento de revolta falou mais alto... Quero me referir a coluna do Sr. Marcelo Rubens Paiva, publicada na pág. 6-2 (Folhateen) de 14 de setembro de 1992. Tenho quatro filhos e me considero um pai de mente aberta e liberal. Dois deles estudam na Unicamp. Foi justamente meu filho mais velho, que cursa o último ano de engenharia, que trouxe o assunto para casa, após ter o mesmo causado espécie e, segundo me informou, revolta entre seus colegas".

O parágrafo acima reproduz alguns trechos iniciais de uma carta do leitor Joaquim Carlos Fanton, de Campinas (SP). Ele protesta contra a coluna de Marcelo Rubens Paiva, publicada no Folhateen da segunda-feira passada. A coluna, intitulada "Invejar homossexuais não é pecado", fazia comentários sobre o que o autor considera a coragem das pessoas que optam pelo homossexualismo.

Em termos bem claros, usando expressões que são consideradas chulas, o autor chegou a descrever, como elementos de sua argumentação, o coito homossexual: "É das experiências mais radicais. Os viados merecem respeito por isso", avaliava o texto de Rubens Paiva, que em determinada passagem, com ironia, cita o manual do sexo seguro publicado pelo Gapa, uma entidade de apoio a portadores do vírus da Aids: "ter o antebraço enfiado no ânus é a experiência de maior prazer. Uau!", acrescentou.

Em sua carta, o leitor Joaquim Fanton se declara preocupado "com o mal que esse tipo de publicação possa causar nas cabeças de jovens inexperientes, que tomem como verdadeiras, naturais e corriqueiras as fantasias escritas pelo sr. Paiva e que elas sejam praticadas por todos, menos por eles. É certo que os tempos mudaram muito, mas as minorias continuam sendo as minorias. Acho bastante difícil coabitar com elas sem delas fazer parte".

Ao missivista de Campinas, juntaram-se outros leitores, que ligaram em protesto. Entre eles, a professora Lucia Batistella da Silva, de São Paulo, e o livreiro Fernando Gomes Ribeiro, de Santos. Ambos criticaram o "tom grotesco, de mau gosto", que viram no texto.

O escritor Marcelo Rubens Paiva defende-se. Diz que autores como Joyce, Flaubert e Henry James também foram em seu tempo, acusados de pornografia: "Muitas vezes nas palavras de baixo calão existem sentimentos nobres e universais".

A respeito dos leitores que reclamaram, Paiva diz que são pessoas que usam vendas nos olhos e não conhecem os filhos que têm. Acha que foi correto usar as palavras que empregou no artigo, como por sua clareza, uma espécie de dialeto das ruas e das escolas, a que todos os jovens de hoje têm acesso, sendo a linguagem que é mais acessível a eles.

Quanto ao mérito, isto é, o suposto incentivo ao homossexualismo presente no artigo, Paiva declara: "Não é incentivo. Mas e se for? Eu só apontei que, ao contrário do que se pensa, os homossexuais, devido a opção de integrar uma categoria que sofre muito preconceito, são muito mais homens do que se pensa. Nas salas de aula pode-se percebe que geralmente os homossexuais são mais judiados."

Marcelo Paiva e o Folhateen - talvez a mais bem acertada iniciativa da Folha nos últimos anos - já estiveram envolvidos em polêmica antes. Foi quando ele defendeu o boicote ao serviço militar e relatou as humilhações a que muitos adolescentes são expostos quando se apresentam para servir.

A coluna despertou temores. A partir dela, os textos de Paiva passaram a ser observados, previamente e com mais atenção, pela cúpula da redação da Folha. Mas nunca houve qualquer corte ou restrição em relação aos textos. Marcelo Paiva elogia a Folha pela liberdade de que dispõe e pela coragem de discutir questões as mais delicadas: "O jornal não faz média com o leitor. Eu me encaixo perfeitamente neste perfil".

Embora o ombudsman não esteja explicitamente impedido de comentar artigos opinativos, eu me considero incapaz d julgá-los por não dispor de critérios objetivos para tal. É, no limite, quase sempre, uma questão de opinião, de um juízo que pertence quase que sagradamente ao autor.

Tais restrições afetam inclusive o julgamento da forma, da linguagem do articulista, embora pessoalmente, eu seja favorável a que o jornal e seus colunistas procurassem se acautelar para não golpear as diferentes suscetibilidades de seus públicos, inclusive juvenis. Assim, talvez se contribuísse mais para que a questão da minoria homossexual fosse encarada com mais respeito, tolerância e menos estranhamento. Mas, como disse, é apenas um opinião, mais uma.

ALTA E BAIXA

ALTA para "O Estado de S. Paulo" e para o "Jornal do Brasil" pela publicação, na quinta-feira passada, de entrevistas com o empresário Pedro Collor reafirmando e dando tom ainda mais dramático a suas revelações iniciais à revista "Veja".


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