Folha de S. Paulo


Manchete anti-Feldmann irrita ecologistas

O período eleitoral tende sempre a produzir reclamações dos partidos contra os jornais. São, muitas vezes, candidatos que se consideram discriminados pelo noticiário. Há ocasiões em que os reclamantes têm razão. Noutras os jornais estão apenas fornecendo ao leitor informações que podem servir como alguns referenciais para uma opção menos insegura na hora do voto.

Assim descrito, o papel da imprensa parece perfeito e imaculado. Mas, frequentemente, ao divulgas os fatos que apura ela interfere conscientemente na campanha como criadora de fatos políticos de repercussão eleitoral. É nessas horas que os jornais podem chamar grande atenção para o seu noticiário.

O teste dos "prefeituráveis" é a única novidade da cobertura da Folha - de resto, quase exclusivamente limitada à divulgação de pesquisas do DataFolha. O teste consiste em uma mesma pergunta dirigida a todos os principais candidatos. As respostas são avaliadas por especialistas, sem que estes saibam os nomes dos autores de cada resposta. A idéia é só engenhosidade, pois permite que os candidatos sejam julgados pelo que propõe e não pelo nome ou pelo seu partido. No teste os "candidatos" têm espaços limitados para a resposta e os avaliadores dão notas, na forma de uma urna sorrindo, séria ou triste, de acordo com o grau de "acerto" da resposta, e fazem um pequeno comentário. De certa maneira esses "testes" também recendem um aroma juvenil, de vestibular, com suas "pegadinhas", suas cascas de banana a propiciar deslizes e manchetes.

No primeiro teste, o prefeiturável menos experiente escorregou. Perguntado sobre o que fazer com moradores clandestinos em áreas de mananciais, Fábio Feldmann, do PSDB, deu resposta que mereceu julgamento severo dos três avaliadores: duas urninhas "tristes" e uma "séria", acompanhadas de comentários sucintos dos avaliadores. Foi a pior nota dos quatro. O candidato verde reprovado na prova dos mananciais.

Fascinada pelo inusitado da situação, a Folha deu manchete no caderno Cotidiano: "Feldmann é reprovado em ambiente". O tom desclassificatório e generalizante do veredito não estava presente nas avaliações dos juízes, o que acarretou protestos unânimes tanto do candidato como de seus avaliadores (Greenpeace, SOS Mata Atlântica e Fundação Brasileira pela Conservação da Natureza).

O tucano Feldmann, em carta a este ombudsman, pergunta: "Como pode a Folha, tomando para si o poder de juiz, condenar um candidato, no amplo tema meio ambiente, com base apenas em uma resposta que não poderia ultrapassar 25 linhas?" Feldmann sugere ainda que o jornal estabelece uma comparação entre as respostas dadas e a atuação de cada candidato em relação ao tema meio ambiente antes mesmo do período eleitoral. Também em carta ao ombudsman, Rubem Almeida, diretor-executivo do Greenpeace Brasil, defende o candidato: "Nossa dissintonia à resposta dada por Feldmann para a solução do problema dos mananciais não significa, de modo algum, que reprovamos o candidato, como sugere a matéria". Os outros dois avaliadores, o superintendente da fundação SOS Mata Atlântica, João Paulo Capobianco, e o ex-presidente da Fundação Brasileira pela Conservação da Natureza, Ibsen de Gusmão Câmara, manifestaram-se da mesma maneira, lembrando a trajetória de atuação ambientalista de Feldmann e deplorando o uso "antiético" (Ibsen) e "leviano" (Capobianco) que a Folha fez de seus julgamentos.

Em defesa da atitude do jornal, a editora de Cidades, Suzana Singer, argumenta que a manchete obedeceu ao melhor julgamento jornalístico: "Não teria a menor atração dizer, por exemplo, que Feldmann fora reprovado na questão dos mananciais. Além disso, a generalização cabe porque a proteção aos mananciais é talvez a questão ambiental mais importante no município de São Paulo".

Eleições são momentos para que os jornais, sem se comprometer com qualquer partido, possam, embora sem transgredir, explicitamente com seus cânones de apartidarismo, se deixarem tomar por uma ânsia de sensação quase tão arrebatadora como a das claques das campanhas dos partidos, só que de sinal trocado. O senso de medida escasseia, a precisão enfraquece, a frieza e o distanciamento vão embora. Há boas razões dos dois lados, mas se tivesse que optar, escolheria uma conduta mais prudente. Talvez fosse um tratamento menos interessante, mas haveria mais respeito à imagem do candidato num momento tão delicado.

ALTA E BAIXA

ALTA para a revista "Veja" por sua excelente reportagem sobre os jardins da Casa da Dinda, no domingo passado. É mais um furo memorável da revista durante a cobertura do Collorgate.


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