Folha de S. Paulo


A guerra dos Jogos

Os jogos Olímpicos chegam ao fim, o que permite a tentativa de uma análise do desempenho da Folha na cobertura da competição. Poucos eventos da agenda Jornalística são mais previsíveis. Poucos são planejados mais meticulosamente e com maior antecedência pelos jornais. Raros são os acontecimentos que isoladamente demandam tanto investimento.

Mas será que o produto apresentado aos leitores expressa essa grande concentração de esforços havida? Houve alguma contribuição, da parte dos jornais, à "tecnologia" da cobertura esportiva a partir dessa Olimpíada?

Infelizmente, acho que a resposta é negativa. Isso não quer dizer que a cobertura tenha ela própria sido ruim em particular. Ao contrário, em essência ela foi como as outras, semelhante à cobertura esportiva de uma maneira geral.

Desde que a TV estabeleceu o domínio que tem na sociedade moderna, os jornais foram obrigados a introduzir mudanças cada vez mais radicais na maneira como trabalhar. O fenômeno ocorreu em todas as áreas, mas afetou mais a cobertura de esportes, especialmente depois que se tornaram comuns as transmissões locais e intercontinentais ao vivo. Não há acontecimento que seja mais intensa e extensamente esquadrinhado pela TV do que os Jogos Olímpicos. É ali que a ideologia do profissionalismo e da tecnologia são levados a um extremo. Não é a TV que vai para transmitir uma competição, mas são os jogos que se oferecem às TVs. Apesar disso, é na área esportiva que os jornais mais dificuldades têm para adentrar a era pós-TV no Brasil.

Para não repetir em piores condições o que a TV faz mais rápido e melhor, cabe aos jornais produzir reportagens com um enfoque diferente, mas aprofundado, crítico, reflexivo e criativo. No Brasil, tal opção teoricamente é facilitada pela indigência da narração e do jornalismo esportivos das TVs, sua gritaria vazia, sua redundância própria de um rádio com imagens, em que se despende uma enorme energia para apenas descrever o que todos estão vendo.

O editor de Esportes da Folha, Sérgio Sá Leitão, considera que o saldo da cobertura das Olimpíadas foi em linhas gerais extremamente positivo porque conseguiu superar as TVs na qualidade da informação oferecida. Destaca o extenso e completo acompanhamento do desempenho dos atletas e equipes nos diversos esportes. O jornal reservou uma página diária para quadros com essa quantificação.

O editor acrescenta que não havia muito como fugir dos temas cobertos pela televisão, pois ela acompanhou sempre as competições mais importantes, de maior interesse.

Apesar da negativa, essa subordinação dos jornais à TV determina profundamente o enfoque e as prioridades da cobertura. Já faz parte desse "clima olímpico" imposto pela TVs e aceito pelos jornais, por exemplo, nos dias anteriores ao início das competições, uma onda de idolatria para com alguns atletas brasileiros, de superestimação de suas possibilidades, de desinformação em suma.

O resultado vem durante as Olimpíadas na forma de seguidas frustrações de leitores desinformados, a medida em que vai aflorando a verdade do atraso esportivo do país. Mas ao contrário também acontece: na edição do dia em que o judoca Rogério Sampaio obteria a única (até ontem) medalha de ouro para o Brasil nessas Olimpíadas, a Folha anunciava que ele lutaria "sem chance" de vitória.

Mas houve também aspectos positivos. Um deles veio da linha de independência política do jornal, que apontou os "torcedores profissionais" presentes em Barcelona e custeados pelo dinheiro de estatais brasileiras. O outro foi a qualidade do texto dos dois enviados especiais do jornal Clóvis Rossi e Alon Feuerwerker e o bom nível do time de intelectuais e artistas que revezou nos comentários a respeito dos Jogos.

O jornalista Clóvis Rossi, entretanto, não tem avaliação tão favorável. Para ele, esta foi a mais frustrante cobertura de que participou em seus trinta anos de carreira.

RETRANCA

Em entrevista à revista "Imprensa", o diretor de Redação de "O Globo" anuncia duas novidades hilariantes. Primeira: o jornal de Roberto Marinho é o mais independente do país. Segunda: "O Globo" tem um ombudsman "há muito tempo". Só esqueceram de avisar os leitores.

Esta coluna informou erroneamente no domingo passado que o jornal "Zero Hora" havia conseguido comprar um contrato igual ao de Cláudio Vieira no Uruguai. O jornal gaúcho teve acesso, sem comprar, a certidões a que os seus concorrentes também tiveram. Apenas editou o material que tinha em mãos de maneira mais esperta que os concorrentes.

ALTA E BAIXA

ALTA para a Folha , cuja tiragem voltou a superar os 400 mil exemplares após alguns meses de queda relativa.

BAIXA para a Folha , por revelar e desmontar esquema que funcionava na Petrobrás para intermediação de anúncios por agência não autorizada.


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