Folha de S. Paulo


Tudo ou nada para Cielo

Quando um treinador escala um time de futebol para um grande campeonato, ele pode se dar ao luxo, no meio daqueles mais de 20 jogadores, de convocar um grande craque que está baleado fisicamente ou que não vem atuando muito bem. Muitas vezes, até vale a pena gastar uma vaga e ter no grupo um grande líder ou um atleta capaz de lampejos de genialidade, mesmo que vá ser usado apenas por alguns minutos, num jogo aqui outro ali.

Na natação, não funciona assim. Vai aos Jogos Olímpicos quem está mais veloz naquela fase do ano. O relógio é quem manda, não existe prêmio por serviços prestados.

Cesar Cielo seria escalado no time de qualquer um que gosta e entende de natação. Mas corre o risco de não nadar no Rio de Janeiro, em agosto. São os números. Neste momento, há nadadores mais rápidos.

Mas ele pode voltar a ser veloz? Essa é a pergunta que todos esperam ver respondida na última seletiva brasileira, que começa hoje na piscina que receberá as provas da Olimpíada.

E no momento, qualquer análise ou aposta positiva é feita com base no que o mais vitorioso nadador brasileiro já fez, não naquilo que vem mostrando nos últimos meses.

O ano passado foi praticamente perdido. Sua melhor marca foi 21s84, cravada em abril. Naquela competição, ele saiu da água insatisfeito, falando em rever sua preparação.

Depois, abandonou o Mundial de Kazan reclamando de problemas no ombro após terminar em sexto lugar nos 50 m borboleta. No fim da temporada, nova desistência, desta vez depois de não ter chegado nem à final dos 100 m livre no Open, a primeira seletiva olímpica.

Havia algo errado, era impossível negar. Ele buscou respostas em uma mudança radical: abandonou a equipe exclusiva que havia montado para si no Brasil e foi treinar com Scott Goodrich, o norte-americano que lhe ajudou a chegar ao tricampeonato mundial em Barcelona-2013. Nos EUA, conseguiu se isolar, deixou de estar totalmente no controle de sua preparação e voltou a ter rivais na raia ao lado durante os treinos. Uma fórmula que já deu certo.

Se dará de novo, veremos na semana que vem. Hoje, há dois atletas com as mãos nas vagas dos 50 m livre: Fratus (21s50) e Ítalo Duarte (22s08). Cielo precisa nadar mais rápido do que isso. Neste ano, tem 22s28 como melhor marca. Ele terá uma única chance para garantir seu lugar na equipe e nadará sob uma enorme pressão.

Cielo é excelente tecnicamente. Se estiver sem dores, bem treinado, ainda é capaz de atingir grandes resultados. Mas precisa acreditar também. E esse talvez seja seu maior desafio: recuperar a confiança e estar com a cabeça no lugar. Nos últimos quatro anos, o nadador trocou de técnicos e programas de treinamento cinco vezes em busca de resultados. No último ano, não conseguiu atingi-los e pode ter se questionado seria capaz de repetir feitos marcantes de novo após uma temporada trágica.

Ricardo de Moura, dirigente da confederação brasileira, voltou dos EUA recentemente e disse que o principal adversário de Cielo é ele mesmo. Esse duelo interno, particular, o nadador terá de vencer antes de pular na água. Seus rivais estão prontos para nadar rápido. E só dois cairão naquela piscina de novo, em agosto.


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