Folha de S. Paulo


Após atentados em Paris, Rio-2016 precisa conter histeria

Na Olimpíada de Londres, em 2012, uma ordem recebida por alguns colegas me chamou a atenção. Parte da equipe de uma das maiores empresas de comunicação dos EUA foi informada de que não deveria sair do hotel durante a cerimônia de abertura dos Jogos. O motivo? Medo.

Não havia nenhum alerta para qualquer tipo de perigo. A cidade estava em festa. Os londrinos seguiam sua vida normalmente. Mas para aquele grupo, simplesmente estar em uma Olimpíada poderia ser um risco. Eles eram todos norte-americanos. Potenciais alvos.

Este é um exemplo pequeno de como a paranoia por segurança pode tomar conta de uma cobertura olímpica. Os Jogos reúnem milhares de atletas, autoridades, jornalistas e turistas de mais de duas centenas de países em uma única cidade.

O terror gosta de grandes eventos para chamar atenção. Em 1972, por exemplo, Mark Spitz ganhou sete ouros na natação em Munique, a melhor performance da história até então. Mas a imagem mais marcante daquela edição é a de um terrorista encapuzado na sacada da Vila Olímpica. Ele era um dos integrantes do grupo Setembro Negro que haviam invadido os quartos de atletas israelenses. A ação terminou com 11 esportistas mortos e colocou um ponto final na inocência esportiva.

Acabou o ir e vir livre de atletas e visitantes na Vila. Acabou a ideia de que o congraçamento esportivo era maior do que toda e qualquer desavença. Dali em diante a palavra segurança passou a ser cada vez mais ouvida em Olimpíadas. Para entrar no Parque Olímpico atualmente, por exemplo, o torcedor tem que mostrar ingressos, passar por detectores de metais e ter sua bagagem checada.

E nessa escalada de medo os gastos com segurança se tornaram um pesadelo para os organizadores. Munique gastou cerca de US$ 2 milhões à época. Montreal, no Canadá, quatro anos depois, chegou a US$ 100 milhões. E as cifras continuam a crescer.

Se em 2012, quando tudo parecia controlado, a paranoia já foi grande, é de se esperar algo bem mais acintoso no Rio. Paris acaba de sofrer o pior atentado de sua história, com mais de uma centena de mortos. E o esquema de segurança da Olimpíada de 2016 começa a reagir a ele.

Como mostrou a Folha, ações devem ser revistas. O orçamento está em R$ 930 milhões. O número de seguranças responsáveis pelas delegações deve crescer, bem como o de agentes estrangeiros. A triagem de quem entra no país também deve ser incrementada. São reivindicações legítimas, mas há de se ter cuidado para não transformar o cuidado em reações exageradas que possam ser inócuas.

A primeira Olimpíada após o 11 de setembro de 2001 é um grande exemplo. Atenas-2004 foi pressionada para criar Jogos seguros. Acabou torrando cerca de U$ 1,5 bilhão em aparatos militares, como baterias anti-aéreas, deixadas bem à vista, próximas a áreas de competição. Nada ocorreu no evento. Mas, anos mais tarde, quando a economia grega quebrou, especialistas apontaram o dedo para a gastança da Olimpíada como uma das causas da crise.

Conter a histeria, medir bem as ações necessárias e racionalizar os gastos são as missões dos organizadores da Rio-2016 e do governo. Segurança é muito importante. Mas gastar os tubos não é a única solução. A melhora pode vir com inteligência, boas ideias, parcerias. Porque os Jogos duram duas semanas. Depois, todos vão embora. O país fica.


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