Folha de S. Paulo


Zika em macacos indica permanência da doença no Brasil

Pesquisadores da USP e da Secretaria da Saúde do Ceará têm uma má notícia para dar: o vírus da febre zika também está presente em macacos silvestres. A confirmação indica que a doença veio ao Brasil para ficar.

Trata-se do chamado reservatório natural, ou seja, uma população de animais em cujo sangue o vírus fica disponível para ser sugado por mosquitos e, a partir destes, voltar a infectar pessoas. O Aedes egypti pica tanto humanos quanto macacos.

É o que acontece no país, por exemplo, com a febre amarela. Só que neste caso existe vacina, que as pessoas podem tomar quando viajam para regiões em que há bichos portadores, como a Amazônia.

"Cada dia é uma coisa mais preocupante", diz Paolo Zanotto, virologista do Instituto de Ciências Biomédicas da USP que chefia o laboratório responsável pela identificação pioneira do zika em primatas brasileiros.

Um relato curto do trabalho (bit.ly/1MN5bis) foi antecipado na página bioRxiv, usado para disseminar estudos -neste caso, de óbvia relevância para a saúde pública- antes mesmo de passarem por revisão de outros especialistas ("peer review").

Aedes aegypti e doenças

Já havia relatos sobre morte de macacos na América Central, em áreas com zika. Para comprovar aqui a previsível formação do reservatório natural, Silvana Favoretto, da USP e do Instituto Pasteur de São Paulo, propôs reanalisar amostras colhidas para estudo sobre raiva em localidades cearenses com zika.

Passou pelo exame material de 15 saguis (Callithrix jacchus) e nove macacos-prego (Sapajus libidinosus). Sete dos animais (29%) tiveram resultado positivo para zika, quatro saguis e três pregos.

Amostras positivas de um macaco de cada espécie foram submetidas então a sequenciamento genético, um teste mais refinado. Constatou-se nos dois casos 100% de similaridade com cepas de zika presentes nas Américas.

Os saguis em questão viviam soltos. Como sabe qualquer um que tenha visitado área próxima de mata no Rio de Janeiro, por exemplo, esses macacos adoram conviver com humanos, de quem ganham ou furtam comida.

Os macacos-prego do estudo eram mascotes, com exceção de um que vivia num centro de resgate em Fortaleza. Após a coleta, todos foram marcados com chips e devolvidos aos vários locais de captura, que abrangiam tanto regiões de caatinga quanto de mata úmida no litoral ou em montanhas.

De outubro de 2015 até a última segunda-feira (18) o Ceará teve 452 casos de microcefalia notificados. Destes, a malformação foi confirmada em 81 bebês (17,9%), com outros 117 casos descartados, e 254 seguem sob investigação.

Das 81 ocorrências positivas, 80 foram submetidas a exame laboratorial para infecção com zika. Em 11 delas (13,6%) constatou-se que de fato o vírus estava presente.

No Brasil todo, 7.150 casos de microcefalia foram notificados até a semana passada, dos quais 2.241 foram descartados e 1.168 tiveram confirmação. As ocorrências positivas ocorreram em 428 municípios espalhados por 22 Estados.

Do total de casos de microcefalia confirmados, 192 tiveram resultado positivo para zika por critério laboratorial específico.

No entanto, segundo comunicado do Ministério da Saúde, esse dado não representaria adequadamente a totalidade do número de casos relacionados ao vírus: "A pasta considera que houve infecção pelo zika na maior parte das mães que tiveram bebês com diagnóstico final de microcefalia".

Zika e microcefalia


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