Folha de S. Paulo


Pinguela ao passado

O PMDB é um comerciante traquejado, desses de faro fino e fina lábia, versado em todas as manhas do negócio. Montou sua barraca no mercadão da barganha política há tempo.

A experiência rendeu larga clientela. Conhece cada freguês pelo nome. Sabe de suas misérias e abastanças. Se o negócio for suculento, vende até fiado, no fio do bigode. Matreiro, só não abre quem são os seus fornecedores.

Assim o comércio prosperou. A quitanda no mercadão da barganha virou loja, que ganhou algumas filiais até se transformar num atacadão.

Como o PMDB acaba de se unir a outros negociantes numa joint venture para conquistar o país - Michel Temer e Eduardo Cunha são CEOs arrojados - não custa espiar uma de suas principais vitrines: o governo do Rio.

O PMDB é um clichê tão surpreendente quanto a propaganda é a alma do negócio. No fim do ano passado, a diretoria de marketing publicou a peça "Uma ponte para o futuro". Alguns dos objetivos são estabilizar a economia brasileira, debelar o endividamento e preservar políticas sociais.

Vejamos o que foi realizado no Rio. Em quase 10 anos de gestão peemedebista, o Estado entrou em colapso. Entre 2007, quando Sérgio Cabral assumiu o comando, e 2015, o endividamento cresceu 112%, chegando a R$ 107 bilhões. O orçamento para este ano é de R$ 80 bilhões.

A política de isenções fiscais lançou pá de cal sobre a economia. Entre 2008 e 2013, o governo deixou de recolher R$ 138 milhões somente em ICMS. O Tribunal de Contas do Estado investiga possíveis ilegalidades.

O drama gerado é inédito. Diante do não pagamento do 13º e do parcelamento dos salários, os servidores decretaram greve geral. Delegacias estão sem papel para os registros de ocorrência e não há gasolina para viaturas.

Unidades de Pronto Atendimento estão sem serviço odontológico e falta até analgésico. O Hospital Universitário Pedro Ernesto corre o risco de suspender suas atividades. Cortes na Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro paralisam estudos sobre dengue e vírus zika.

O mesmo não ocorre em relação a empresas parceiras, algumas investigadas pela Operação Lava Jato. Em dezembro do ano passado, o governo assumiu dívida de R$ 39 milhões da Supervia, que opera o transporte ferroviário, com a Light.

A Supervia é controlada pela Odebrecht, suspeita de pagar propina de R$ 2,5 milhões a Sérgio Cabral. O ex-governador também teria recebido suborno da Andrade Gutierrez, segundo delação de executivos.

O colapso no Rio não é causado pela crise do petróleo, como alega o governo, mas pelo modelo de gestão peemedebista. O PMDB, que quer ser ponte para o futuro, mostrou no Rio que é uma pinguela para o passado.


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