Folha de S. Paulo


Projeto Varre Vila ganha reportagem fotográfica em livro e exposição

Uma reportagem fotográfica registrou a história e mostra o orgulho dos moradores participantes do projeto Varre Vila nas comunidades de Nossa Senhora Aparecida e União de Vila Nova, em São Miguel Paulista, e Jardim Robru e Parque Santa Rita, em Itaim Paulista, na zona leste de São Paulo.

O projeto começou há 4 anos, quando o líder comunitário Ionilton Gomes de Aragão, educador e ex-agente de saúde, resolveu tentar diminuir o lixo e a sujeira na sua vizinhança. E ele conseguiu com armas poderosas: informação, comunicação e mobilização.

A situação inicial não era diferente daquela que milhares de comunidades vivem pelo Brasil afora: o lixo domiciliar se avoluma nos chamados pontos viciados dos bairros, que podem ser terrenos baldios, casas abandonadas, becos, ilhas de avenidas.

Em Nossa Senhora Aparecida, o ponto era uma rotatória que é a confluência de seis ruas. A empresa de limpeza passava três vezes por semana, em horas marcadas. A regra é colocar duas horas antes da coleta, mas os moradores colocavam lixo lá o tempo todo, o que atraía ratos e insetos.

Marlene Bergamo/Divulgação
Eremita Messias de França, moradora de São Miguel Paulista, na área do Varre Vila, em foto do livro 'Se essa vila fosse minha'
Eremita França, moradora de São Miguel Paulista, em foto do livro 'Se essa vila fosse minha'

Para começar a resolver, Aragão entrou em contato com a empresa responsável pela coleta e pediu que limpassem totalmente a rotatória. Mobilizou alguns vizinhos e fez guarda no local após a limpeza. Todo lixo jogado fora de hora era imediatamente retirado pelo grupo de vigília, de forma que o morador que ia depositar sempre era o primeiro a sujar o espaço público. O grupo informava a quem ia depositar o lixo os horários corretos da passagem do caminhão.

Em um mês, conta Aragão, a mensagem sobre a necessidade de respeitar os horários para que a rua ficasse limpa foi captada. A mobilização aumentou e resolveram então propor que cada morador varresse a porta de sua casa diariamente. Deu resultado.

Convocando reuniões relâmpago nas ruas, para dar informes das iniciativas, passar videos sobre limpeza e melhorias possíveis na comunidade e tomar decisões locais, Aragão foi entendendo que a informação sobre a coleta não chegava aos moradores. Como resultado, havia falta de confiança no processo todo, e também nas empresas de limpeza e nos serviços da prefeitura. No final das contas, isso alimentava o fluxo de lixo na rua.

Aragão sistematizou o projeto Varre Vila e conseguiu apoio da empresa que atua na área, a Soma, para contratação de moradores como agentes de limpeza da região e a produção de sacolas de lixo com o nome da comunidade. Depois da empresa, o projeto contatou a prefeitura.

A mobilização prosseguiu e os moradores continuam cuidando dos bairros. "Nas áreas do Varre Vila, 95% do problema de pontos viciados está solucionado", diz Aragão. A rotatória virou símbolo do movimento e hoje há uma sede do projeto no local.

Os contratados pela limpeza agora já se ocupam de melhorias como jardins. "Uma coisa vai puxando a outra. Se a comunidade cuida, o poder público comparece. A gente provoca a atenção", diz Aragão.

Além da coleta regular de lixo, há um calendário com dias fixos em que a comunidade pode despejar entulho e bagulhos (móveis quebrados, objetos descartados) em caçambas.

Aragão planeja fazer uma pequisa nas comunidades para avaliar aceitação e conhecimento que as pessoas têm do Varre Vila. " 2016 é o ano de firmar o projeto", diz ele.

Em maio, deve ser lançada uma campanha nas comunidades participantes. Cada família tem de dar conta de cinco tópicos para obter um selo de sustentável: 1 - Varrer a porta da casa diariamente; 2 - Fazer a coleta seletiva; 3 - Separar o óleo de cozinha; 4 - Usar recipiente para compostagem e 5 - Não ter foco de dengue em casa.

No núcleos do Varre Vila instalados hoje na capital, as atividades estão se diversificando. Em ecopontos experimentais, hortas comunitárias com cultivo de ervas medicinais para uma farmácia viva estão sendo produzidos.

Aragão planeja também instalar Casas do Cuidado. "Ali, quem cuida da comunidade vai ser cuidado. Isso valoriza o trabalho das pessoas. Serão encontros dos agentes de saúde e dos trabalhadores do Varre Vila".

A parceria, conta Aragão, é muito proveitosa. "Trabalhando juntos, eles economizam esforços. Os agentes comunitários de saúde conhecem as pessoas da comunidade. Quando vão visitar as casas, levam também sacos de lixo."

Em São Paulo, o projeto deve se expandir para a Brasilândia com o nome de Nossa Vila Limpa, e a empresa Inova. Fora do Estado, o Varre Vila virou Varre Grota em Maceió, Alagoas, e Aragão está estudando propostas para realizar trabalhos semelhantes em Aracaju (SE), Guarulhos (SP) e Salvador (BA). Em 2020, a meta é "ter um bairro em cada capital brasileira com projeto desse tipo", diz Aragão.

A reportagem fotográfica que mostra a comunidade está no livro e na exposição "Se Essa Vila Fosse Minha", coordenados pelo documentarista italiano Daniele Ottobre, com fotos de Paulo Vitale, Marlene Bergamo e Anna La Stella.

Ottobre foi convidado a fazer um documentário sobre o projeto e diz que não se animou muito no começo. "Mas me supreendi com o que vi", diz. "Acho que a comunidade pode dar exemplo às periferias de outros países. Quando vi as pessoas que estavam limpando a rua e colocando águas nos vasos das plantas, fiquei encantado. Então resolvi mostrar mais que tudo a beleza, o orgulho das pessoas que moram ali", conta.

O lançamento do livro e a abertura da mostra de fotos serão na segunda, 21 de março, na Galeria Olido, no centro. As obras estarão à venda e a renda será revertida para melhorias da praça da rotatória que é símbolo do projeto.

LIVRO E EXPOSIÇÃO "SE ESSA VILA FOSSE MINHA"
QUANDO Lançamento em 21/3, às 19h; visitação de 22/3 a 22/5 (ter. a dom.), das 13h às 20h
ONDE Galeria Olido (1.º pavimento) - av. São João, 473, centro, São Paulo, tels. (11) 3331-8399 e (11) 3397-0171


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