Folha de S. Paulo


'O Mestre e Margarida', de Bulgákov, ganha nova tradução do russo

"O Mestre e Margarida" —romance que Mikhail Bulgákov escreveu no longo período de ostracismo político vivido durante o stalinismo, entre 1928 e 1940 (ano de sua morte)— acaba de ganhar nova tradução do russo, pelo jornalista e crítico musical Irineu Franco Perpetuo, com base na mais recente tentativa de estabelecer uma edição definitiva para a obra-prima do escritor nascido em Kiev, na Ucrânia, em 1891.

O Mestre e Margarida
Mikhail Bulgákov
l
Comprar

A condição de exilado interno do regime soviético é indissociável do livro, que lança mão de procedimentos satíricos e paródicos. Ao mesmo tempo em que ridiculariza os escritores "oficiais", servis ao "realismo socialista" (que ditava padrões estéticos socialmente edificantes), Bulgákov cria uma versão bufa do mito fáustico, inspirando-se tanto no poema trágico de Goethe quanto na ópera de Gounod sobre o pacto de Fausto com Mefistófeles —mas também com elementos cômico-fantásticos inspirados em Gógol e ambientados na Moscou dos anos 1930.

O Mestre e Margarida. Autor: Mikhail Bulgákov. Tradução: Irineu Franco Perpetuo. Editora: 34 (2017, 408 págs., R$ 69)

Reprodução
Capa do livro

*

SÉRIE

Ressaca da podridão
"Jack Taylor" é uma adaptação dos romances de Ken Bruen, irlandês que viajou pelo mundo antes de se tornar escritor e chegou a passar por uma prisão no Brasil —acontecimento traumático que, segundo ele, incluiu sessões de estupro e seria determinante em sua carreira como autor de ficção policial.

O personagem epônimo é um investigador beberrão de Galway (cidade natal de Bruen) que foi expulso da polícia após agredir um político. Atormentado e visceral, características realçadas pela atuação cativante do galã cinquentão Iain Glen (de "Game of Thrones"), Taylor lança mão de expedientes pouco ortodoxos e de suas amizades na Garda (força policial irlandesa) para devassar, sempre de ressaca, crimes de empresários inescrupulosos, padres pervertidos e fanáticos políticos —enfim, a podridão invisível que o fez cair em desgraça por ostentar insolência diante de homens públicos nada respeitáveis.

Jack Taylor. Direção: Stuart Ormes. Elenco: Iain Glen, Nora-Jane Noone e outros. Produtora: Magna (2010-2016). Na Netflix

*

DISCO

Delírios etílicos e místicos
O clarinetista sueco Emil Jonason interpreta duas peças de compositores contemporâneos inspiradas em estados de alteração de consciência. O concerto "The Erratic Dreams of Mr Grönstedt" foi escrito especialmente para o solista por seu conterrâneo Christian Lindberg, trombonista e maestro que rege aqui a sinfônica de Norrköping.

O tal "Senhor Grönstedt" do título homenageia ironicamente uma marca escandinava de conhaque e nos induz a captar a atmosfera de devaneio, temor e erotismo dos "sonhos erráticos" que atravessam os cinco movimentos da peça. Já em "The Dreams and Prayers of Isaac the Blind", em que o solista é acompanhado pelo quarteto Vamlingbo, o argentino Osvaldo Golijov cria variações sobre os delírios místicos de um rabino cego, célebre cabalista do século 13, numa pulsante e lânguida apropriação da música klezmer —gênero não litúrgico da tradição judaica que é uma das especialidades do prodigioso Jonason.

Emil Jonason Plays Lindberg & Golijov. Artistas: Emil Jonason e Christian Lindberg. Gravadora: Bis (2017, R$ 88,30, importado)

*

A coluna "Edição Cult" é publicada aos domingos, a cada 15 dias, na revista sãopaulo.


Endereço da página:

Links no texto: