Folha de S. Paulo


O dia em que o FBI acordou Zurique e a Fifa

Eram 6h47 do dia 27 de maio de 2015 em Zurique, 1h47 no horário de Brasília. Tomei um susto. Meu telefone celular piscava com um aviso urgente da britânica BBC: cartolas da Fifa hospedados no luxuoso cinco estrelas Hotel Baur au Lac haviam sido presos. O FBI pegara a cartolagem.

A Folha tinha me enviado à cidade suíça, dois dias antes, para cobrir o congresso da entidade que começaria no dia 28.

O palco estava montado para mais uma reeleição de Joseph Blatter, até então no cargo desde 1998. Não havia qualquer sinal de que haveria aquela ação policial, fruto de investigação das autoridades americanas.

Cartolas da Fifa, entre eles o brasileiro Marco Polo del Nero, circulavam sorridentes pelo lobby do Baur au Lac na noite anterior. O hotel é de um luxo só. Um café expresso, por exemplo, não custa menos de R$ 60.

Uma das polêmicas para o encontro da Fifa, veja só, era se a Conmebol (Confederação Sul-Americana de Futebol) perderia ou não o direito de disputar na repescagem uma quinta vaga na Copa do Mundo.

Há quem acredite que aquele 27 de maio tenha sido o início de uma revolução ética no futebol. Outros são mais céticos, mas é fato que caía naquela manhã um vasto esquema de corrupção de mais de US$ 100 milhões que operava havia mais de 20 anos, envolvendo fraude, extorsão e lavagem de dinheiro em negócios ligados a campeonatos na América Latina e acordos de marketing e transmissão televisiva.

Minutos após a prisão dos cartolas no hotel, seguranças cercavam a portaria e uns vinte jornalistas na calçada buscavam informação. Já surgiam rumores de que entre os presos estava José Maria Marin, ex-presidente CBF. Pouco mais tarde, as autoridades suíças e americanas confirmaram sua prisão.

Na véspera da operação do FBI, o presidente da CBF, Marco Polo del Nero, participou de um coquetel no Baur au Lac. Estava bem tranquilo, longe do Del Nero assustado da manhã seguinte, quando afirmou que a prisão do antecessor era "péssima" para a imagem da CBF (como seria para o próprio Del Nero, meses depois).

Em meio ao caos daquele dia em Zurique, a Fifa convocou uma entrevista coletiva em sua sede para o então diretor de Comunicação, Walter de Gregório, dizer que a entidade era parte "prejudicada" e que a operação policial era uma "coisa boa" para ela.

Gregório tinha certa razão. Pouco depois, ele caiu, assim como o reinado de seu chefe, Joseph Blatter.


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