Folha de S. Paulo


Defesa do indefensável

Nada mais natural, e antigo, do que a busca de grupos encastelados no poder para manter tudo como está, por mais que a situação seja insustentável, fruto da incompetência e da rapinagem que os mantêm para infelicidade e fragilização de nosso futebol.

A resistência da CBF e dos clubes, com a honrosa exceção do Flamengo, à medida provisória do futebol é nova prova disso.

Se dissesse que nossos estádios estão lotados, que a qualidade técnica do futebol jogado é como a de antes e que os clubes vivem saudavelmente, sem dívidas e capazes de não exportar pé de obra, não haveria necessidade de modernizar a gestão e de mudar o atual estado de coisas, desnudado pelo simbólico 7 a 1 alemão sob nossas barbas e diante da perplexidade ampla, geral e irrestrita.

A pobreza da argumentação dos defensores do status quo, a mesquinhez de seus objetivos e a desonestidade intelectual que a caracteriza é a mesma de quando se discutiu, no governo FHC, o Estatuto do Torcedor.

Então, a cartolagem dizia ser impossível numerar os estádios, disponibilizar ambulâncias durante os jogos ou instalar câmaras para identificar baderneiros.

Tudo foi feito, mesmo sob ameaça da cartolagem de paralisar o Campeonato Brasileiro, até com arguição de inconstitucionalidade do texto legal, depois desmoralizada no Supremo Tribunal Federal e, apesar de o Estatuto ainda não ter pegado 100%, a vida seguiu normalmente.

O passo adiante, urgente, que se quer dar agora enfrenta as mesmas resistências, com mais chances de sucesso, dado o clima político no Congresso Nacional.

No braço de ferro entre o velho e o novo, e diante da possibilidade do triunfo jurássico, talvez não reste outra alternativa que não a já preconizada pelo Ministério da Fazenda: cobrar o que é devido e deixar quebrar quem não saldar seus compromissos.

Não é o desejável nem parece ornar com os usos e costumes nacionais, mas pode ser o caminho.

Os ex-presidentes Fernando Henrique e Lula tabelaram para fazer avançar a legislação esportiva –o primeiro ao trabalhar para que esta viesse à luz como medidas provisórias, o segundo ao assiná-las quando aprovadas pelo Congresso Nacional.

Desafiada, é provável que Dilma Rousseff fique impotente para dar o novo passo à frente, obrigada a vetar o que significar a manutenção do atual descalabro.

Você já leu aqui que não há instituição no Brasil mais reacionária, avessa a quaisquer mudanças, além de corrompida e corruptora, do que a superestrutura do esporte nacional, talvez a última a, um dia, sofrer o choque de modernidade de que necessita.

Antes, o talento do jogador brasileiro e suas vitórias mascaravam o atraso da gestão e os coronéis pintavam, bordavam e enriqueciam. Sobraram só os coronéis e seus métodos.

O triste é constatar como o apaixonado torcedor não se mobiliza para pressionar pela mudança, sem se dar conta de sua importância.

Pobre futebol rico.


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