Folha de S. Paulo


Ventos anticorrupção sopram em todo o mundo e com intensidade inaudita

Ventos anticorrupção, impulsionados por tendências a modelar o século 21, sopram em escala global e com intensidade inaudita.

Jovens democracias, como Coreia do Sul e Romênia, testemunham o avanço de movimentos empenhados em demandar mais transparência e melhor governança, resultado de um fenômeno que se convencionou descrever como "empoderamento da sociedade civil".

Jung Yeon-Je - 10.mar.2017/AFP
Manifestantes carregam cela falsa com boneco de Park Geun-hye em protesto na Coreia do Sul
Manifestantes carregam cela falsa com boneco de Park Geun-hye em protesto na Coreia do Sul

Os episódios romeno e sul-coreano, em desdobramento há meses, são emblemáticos. Embora mundos à parte na geografia, os dois países guardam semelhanças, como a atual construção democrática, após ditaduras esfareladas no final dos anos 80 por ondas mudancistas do final da Guerra Fria.

Após atravessar os abusos da ditadura comunista de Nicolae Ceausescu, que tentou resistir à bala ao furacão que varreu regimes pró-URSS da Europa oriental em 1989, a Romênia embarcou no processo democrático, impulsionado pela adesão à União Europeia, em 2007.

O combate à corrupção, apesar de novos ares trazidos pela integração continental, fraquejava. No final do ano passado, um gabinete romeno recém-eleito agiu rapidamente para introduzir legislação interpretada como iniciativa para enfraquecer esforços contra "crimes de colarinho branco" e para livrar da Justiça um líder do governista Partido Social-Democrata.

A partir de janeiro, os maiores protestos de rua desde o fim do regime comunista invadiram a capital Bucareste. O governo romeno recuou. No começo de maio, novas leis oriundas do Senado e decisões da Suprema Corte fortaleceram o movimento anticorrupção.

Também no início deste mês, a Coreia do Sul elegeu um presidente com discurso embalado por promessas de mudanças. Moon Jae-in venceu a votação prevista originalmente para dezembro, mas antecipada pelo impeachment da presidente Park Geun-hye, em processo baseado em acusações de corrupção.

Em março, a Suprema Corte sul-coreana confirmara o afastamento de Park Geun-hye, aprovado numa primeira etapa pela Assembleia Nacional no final do ano passado.

Quando do surgimento das primeiras denúncias contra a presidente, avalanches de manifestantes tomaram ruas de Seul na maior mobilização popular registrada no país que experimentou a ditadura militar entre as décadas de 60 e 80.

O parente asiático da Operação Lava-Jato também resultou, em fevereiro, na prisão de Lee Jay-yong, vice-presidente e herdeiro da Samsung, principal empresa sul-coreana. Moon Jae-in, o novo presidente, promete reformar laços entre o governo e os gigantescos conglomerados, símbolos da decolagem econômica das últimas décadas.

Coreia do Sul e Romênia ilustram ventos globais, também a influenciar o Brasil. O momento histórico registra interação de vetores como globalização, avanços democráticos, ascensão de novas classes médias e acelerada revolução tecnológica.

Como resultado, sociedades civis fortalecidas, com mecanismos para demandar transparência nos meandros do poder e avançar sobre mazelas da corrupção, ainda que em processos marcados por turbulências e percalços.


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