Folha de S. Paulo


Constrangimento prisional

SÃO PAULO - "Prisão foi para constranger", declarou o ex-ministro Paulo Bernardo ao ser solto após ter seu encarceramento preventivo relaxado por ordem do STF.

É difícil discordar de que as autoridades responsáveis por investigações de corrupção usem as prisões preventivas como forma de pressionar suspeitos a aderir à delação premiada. A utilização de armamento psicológico (e não exclusivamente jurídico) não me incomoda. Preocupa-me mais o fato de boa parte desses confinamentos cautelares não atenderem, senão sob interpretação forçada, as hipóteses previstas em lei.

Vou um pouco mais longe e afirmo que a própria ideia de punir condenados restringindo sua liberdade é um arcaísmo judiciário que só seguimos aplicando por inércia. Prisões têm um alto custo econômico e social e não recuperam o criminoso –na verdade, podem aperfeiçoá-lo. Deveríamos, portanto, reservá-las para casos de indivíduos violentos e com tendência a reincidir, procurando alternativas para aqueles que não se enquadrarem nessa situação. Creio que, no futuro, as pessoas olharão para nossa mania de castigar pessoas trancafiando-as com o mesmo espanto com que vemos os métodos pelos quais bruxas eram julgadas na Idade Média.

Resisto, porém, em abraçar a tese, cara a advogados criminalistas, de que a Lava Jato e congêneres inauguraram um regime de exceção, que atropela sistematicamente os direitos de réus. Uma afirmação dessas não pode ser feita "in abstracto", contra o que julgamos ser a melhor interpretação da lei, mas sim em relação a como a Justiça opera no Brasil real. E, aí, os investigados por corrupção, só pelo fato de terem acesso a advogados, provavelmente estão em vantagem. Não é demais lembrar que cerca de 30% das indivíduos que estão atrás das grades no país nem sequer foram julgados. O problema não é a Lava Jato, mas sim as proverbiais deficiências da Justiça brasileira.


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