Folha de S. Paulo


Altruísmo afetivo

SÃO PAULO - Você está disposto a reduzir a carga de sofrimento animal no planeta, mas não está pronto para renunciar inteiramente às proteínas animais? Então pare de comer frango. Nossos amigos emplumados são, de longe, a espécie mais maltratada na cadeia de produção industrial de alimentos. São também aqueles que mais se beneficiariam (em número de indivíduos) com a redução da demanda.

A sugestão do filósofo William MacAskill é um exemplo perfeito de raciocínio consequencialista (o maior benefício, para a maioria) aplicado ao altruísmo. Seu mais recente livro, "Doing Good Better" (fazendo o bem melhor), é um grande catálogo de como otimizar nossa vontade de ajudar ao próximo segundo critérios racionais e quantificáveis. Estamos na era do altruísmo baseado em evidências.

MacAskill ataca em todas as frentes, desde mostrar quais ONGs proporcionam mais bem-estar por dólar investido, até oferecer conselhos sobre qual carreira um jovem disposto a "fazer a diferença" deve escolher. Ele ensina, por exemplo, que promover a vermifugação de crianças na África tende a ser mais efetivo do que programas de entrega de livros didáticos e que tornar-se cirurgião plástico e doar parte do salário pode valer mais que virar cirurgião cardíaco no Médicos Sem Fronteiras. É tudo uma questão de números.

O autor não foge de questões polêmicas. Insiste, por exemplo, que não devemos em geral doar dinheiro para vítimas de desastres naturais (essa não é uma área negligenciada) e defende os "sweatshops", fábricas que mantêm empregados em condições que alguns chamam de análogas à escravidão. A alternativa, mostra MacAskill, tende a ser muito pior.

Meu porém em relação ao livro é que, se todos seguirmos as recomendações do autor, em pouco tempo o mundo estará reduzido a meia dúzia de ONGs atuando em dois ou três setores. O sub-ótimo precisa existir como condição para tornar-se melhor.


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