Folha de S. Paulo


Verdades dietéticas

SÃO PAULO - O homem é aquilo que come. No original alemão de Feuerbach, "der Mensch ist, was er isst", a frase se torna ainda mais saborosa, já que "é" ("ist") e "come" ("isst") têm a mesma sonoridade, evocando o bíblico "ele é aquele que é". O problema é que simplesmente não é verdade que sejamos o que comemos. Dietas, como mostra Alan Levinovitz, em "Gluten Lie" (a mentira do glúten), são terreno mais favorável à divulgação de teses religiosas do que de teorias científicas.

Levinoviz sabe do que fala. Ele, afinal, é especialista em história das religiões. Embora não seja expert em nutrição, fez a lição de casa, entrevistando cientistas, médicos e psicólogos. O que mais impressiona no livro é justamente a recorrência dos mitos.

Anunciado como nova verdade dietética, o perigo do glúten, por exemplo, encontra precedente nas exortações de monges prototaoístas chineses que prometiam a imortalidade para quem adotasse alimentação livre de grãos. Isso se repete com todos os vilões, dos glutamatos, à gordura saturada, passando por açúcar e sal. Tudo o que você puder imaginar já foi demonizado por alguma seita –e alguma dieta moderna.

A diferença é que agora a condenação moral vem revestida de discurso científico. Qual a evidência de que façam mal? De modo geral, não muita. É claro que, se você tiver doença celíaca, não pode comer glúten. Se for hipertenso, deve evitar o sal. Mas, para pessoas sem moléstias como essas, ou seja, a maioria da humanidade, nenhum alimento é venenoso.

Levinovitz talvez exagere ao exigir que toda recomendação, além de comer com moderação, esteja amparada em sólida evidência estatística. Para ele, a ciência da nutrição é tão complexa, e os efeitos deste ou daquele alimento sobre a saúde tão modestos, que dificilmente saberemos ao certo o que faz bem e o que faz mal. Pode ser, mas, se ele estiver errado, antes de contar com dados irrefutáveis teremos indícios críveis.


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