Folha de S. Paulo


Moedor ligado

Há pouco mais de três anos, em abril de 2013, escrevi aqui uma coluna com o título "Moedor de piloto".

O gancho era a promoção do português António Felix da Costa, então com 21 anos e vencedor do GP de Macau, a piloto de testes da Red Bull. Esse movimento jogava Sébastien Buemi, que ocupava o cargo, para escanteio.

O texto lembrava de tantos e tantos "novos talentos" incensados pela fabricante de energético para logo depois serem descartados.

"Assim como já aconteceu com Liuzzi, Alguersuari, Klien, Speed, Chandhok, Doorbnos, Friesacher, Kartikheyan, Bianchini, Jani, Bortolotti, Albuquerque, Edwards, Hartley, Dillimann, Coletti, Ammermüller, Aleshin... Há muitos, muitos outros na lista.

A iniciativa da Red Bull de criar um Programa de Desenvolvimento de Pilotos é louvável. É exemplar. Seria ótimo que outras empresas, donas de equipe ou não, fizessem o mesmo.

O que questiono é a falta de paciência da empresa com seus pupilos. O que vale a discussão é se a Red Bull não está queimando essa garotada. O que me parece é que é um esquema 8 ou 80: ou você é um Vettel ou está queimado."

Philippe Lopez/AFP
Infiniti Red Bull Racing's Russian driver Daniil Kvyat is seen in the garage after the practice session of the Formula One Singapore Grand Prix in Singapore on September 18, 2015. AFP PHOTO / Philippe Lopez ORG XMIT: PL62
Daniil Kvyat em sua Red Bull durante o GP de Cingapura de 2015

Esses três últimos parágrafos são da coluna de três anos atrás. Mas poderiam ter sido escritos ontem, especialmente para esta. Porque Kvyat é o mais novo piloto a experimentar a frigideira –ou o moedor– da empresa/equipe.

(De lá para cá, além do próprio Felix da Costa, dançaram Vergne, Blomqvist, Lynn, Stoneman e O'Keeffe. Por enquanto.)

Nenhum corte, porém, foi tão cruel como o do russo.

Kvyat é o dono do melhor resultado da equipe na temporada, o terceiro lugar no GP da China. Está atrás de Ricciardo, é fato, a 15 pontos. No ano passado, após quatro provas, a diferença era exatamente a mesma –e sem o pódio.

Isso já derruba uma das explicações de Helmut Marko, ex-piloto que comanda toda a estrutura de formação de pilotos da Red Bull. Segundo ele, o desempenho de Kvyat despencou em relação ao ano passado. Falso.
Qualquer outra explicação que não seja a ascendência de Vettel sobre a Red Bull ou a pressão da Ferrari, que cede motor para a Toro Rosso, não me convence.

Em Barcelona, Kvyat começa sua jornada rumo ao ostracismo. O histórico aponta que ele dificilmente sairá da espiral negativa.

Sem culpa de nada, Verstappen, 18, assumirá o posto na equipe principal. Tem talento para prosperar, é o que vem mostrando desde as categorias de base.

Antes de pensar em grandes conquistas, porém, precisa entender o ambiente em que está. Ficar amigo de Vettel é um bom começo.

O moedor nunca desliga.


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