Folha de S. Paulo


Resistência alemã

Eram os primórdios dos joguinhos de computador, garranchos rupestres comparados aos atuais, e eu delirava com Hockenheim. Aquele retão no meio da Floresta Negra, interrompido brevemente por uma chicane, para continuar até a Ostkurve... Era de perder o fôlego, mesmo naquele velho PC, no canto do quarto.

Não imaginava que trabalharia com isso, que um dia pisaria ali, que ali vivesse um dos momentos mais emocionantes de meus anos de F-1, a épica primeira vitória de Barrichello. O circuito foi desfigurado em 2002, obra de Tilke, o arquiteto preferido de Ecclestone. E em 2006 embrenhei-me nas ruínas do antigo traçado para uma reportagem relatando o que havia sobrado por lá.

"Trechos que se tornaram lenda. Eram dois arcos, de raio tão reduzido que na prática funcionavam quase como retas velocíssimas, com dois quilômetros cada um. No seu ponto mais veloz, David Coulthard, ao volante de um McLaren, atingiu 356,5 km/h em 1998, então o recorde da categoria –hoje, é 367 km/h, marca cravada por Juan Pablo Montoya, em Monza, em agosto do ano passado", relatava o texto.

Mas essas são digressões pessoais. Hockenheim é muito, muitíssimo mais. Foi lá que Clark morreu numa corrida de F-2, em 68, que Piquet socou Salazar, em 82, que Senna decolou e se feriu após um pneu estourar, em 91.

E o que dizer de Nurburgring? Quanta história pra contar?

Um circuito inaugurado no fim dos anos 20 e que já teve míticos 28.265 m de extensão –sim, você leu certo. Que recebeu a F-1 por 26 vezes, a primeira delas no segundo ano de existência da categoria, 1951. Uma prova com apenas 20 voltas, dada a extensão do traçado.

Nurburgring que era playground de Fangio: venceu lá três anos seguidos pilotando carros de três marcas diferentes, Mercedes, Ferrari e Maserati. Nurburgring que matava muito –só perde para Indianápolis em número de acidentes fatais na F-1.

Nurburgring que mudou quando quase matou mais um, Lauda, em 76. E que foi testemunha do primeiro deslumbre internacional por Senna, quando da reinauguração, em 84 –o brasileiro venceu uma prova com modelo 190 E da Mercedes contra alguns dos melhores do mundo.

Pois nem a Mercedes foi capaz de salvar Hockenheim ou Nurburgring e o GP da Alemanha.

Nos últimos 20 anos, o país conquistou dez Mundiais de Pilotos. A Mercedes é a atual e a futura campeã de Construtores.

Nada disso adiantou. A séria Alemanha não conseguiu dinheiro para assegurar seu GP. No começo da semana, a prova foi sacada do calendário. Uma pena.

Ou eles não gostam de F-1 ou, em tempos difíceis para a economia mundial, são prudentes o bastante para não gastar as fortunas que Ecclestone exige para seu circo.

No que você apostaria?


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