Folha de S. Paulo


Sobrevivente

Dono da Red Bull, Dietrich Mateschitz não é bilionário por acaso. Seus mais de US$ 5 bilhões não lhe caíram no colo, tampouco lá permaneceram por benção divina.

Ele é esperto. Muitíssimo esperto. E aplica com maestria um preceito básico da liderança no mundo corporativo: delegar.

É apaixonado por F-1.

Célia Gouvea Franco-15.out.1999/Folhapress
Dietrich Mateschitz, fundador e dono da Red Bull
Dietrich Mateschitz, fundador e dono da Red Bull

Até aí, nenhuma novidade. Ao longo da história, dezenas de bilionários torraram dinheiro na categoria. Alguns tiveram seus brilharecos. A maioria desapareceu tão rápido como chegou.

Ocorre que Mateschitz nunca teve a vaidade de colocar fones de ouvido e ir ao pitwall brincar de comandar pilotos. Preferiu continuar curtindo seu esporte, como fã.

Delegou. Colocou especialistas nas posições-chave de sua equipe.

Um deles tem status de homem de confiança. É mais importante que qualquer engenheiro ou executivo. E tem como atribuição algo intrínseco à alma da equipe e que diz muito sobre seu sucesso: formar talentos.
Helmut Marko, 71, também austríaco, é quem comanda desde a gênese da Red Bull toda a estrutura de formação de pilotos.

Um processo duro, que já mereceu coluna nesta Folha em abril do ano passado. "Moedor de piloto" questionava a falta de paciência da empresa com jovens pilotos e citava vários que foram queimados ao longo dos anos: Alguersuari, Klien, Speed, Doornbos, Friesacher, Bianchini, Jani

Mas, concorde-se ou não, é assim que funciona.

Marko seleciona um garoto, dá a ele todos os recursos para se desenvolver, mas não faz cerimônias em dispensá-lo se algo lhe desagradar.

Para sobreviver ao moedor não basta ser talentoso, bacana, rápido. Para passar por todas as peneiras, correr na Toro Rosso e ser promovido à Red Bull, é preciso ser realmente especial.

Até hoje, só dois foram. Vettel e Ricciardo.

O alemão, o mundo já conhece. O australiano está mostrando suas cartas nesta temporada. E que cartas...

Após 11 corridas pela Red Bull, é o terceiro no campeonato, só atrás das inalcançáveis Mercedes. Tem 131 pontos na tabela, contra 88 do companheiro, tetracampeão. É o único a quebrar a hegemonia de vitórias da equipe prateada. Duas vezes.

Na Hungria, no domingo, brilhou como um veterano.

Escapou de confusão na largada, perdeu posições, não se apavorou, controlou o ritmo, administrou os pneus, atacou na hora certa, venceu. Pacote completo.

Ricciardo será um dia campeão do mundo.

Marko merecerá boa parte dos créditos.

(Como que para completar o brilho da história, não deixa de ser irônico que o melhor olheiro da F-1 tenha a visão só de um olho. O esquerdo foi atingido por uma pedra lançada do carro de Emerson no GP da França de 72. Ali, encerrou a carreira de piloto.)


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