Folha de S. Paulo


Sem a máquina do PMDB, o caminho ficou aberto para novidades

Yasuyoshi Chiba - 30.out.2016/AFP
O prefeito eleito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella (PRB)
O prefeito eleito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella (PRB)

A eleição de 2016 para a Prefeitura do Rio de Janeiro foi o que, no futebol, chamaríamos de uma final inédita. A grande máquina do PMDB (equivalente local da tucana em São Paulo) lançou um candidato inelegível, acusado de agressões contra a mulher. Sem a máquina peemedebista e sem financiamento privado de campanha, o caminho ficou aberto para novidades à esquerda e à direita.

Tucanos e petistas reclamaram de ter que escolher entre o socialista Marcelo Freixo e o líder evangélico Marcelo Crivella. PT e PSDB só têm a si mesmos para culpar por não terem ido ao segundo turno.

Quando o tucano Osório e a comunista Jandira tentaram "nacionalizar" o debate discutindo o impeachment, mais de um carioca se perguntou, "mas será que a disputa nacional ainda são esses caras?".

E, deve-se dizer: se a tarefa era escolher os dois candidatos que melhor conheciam o Rio profundo, acho difícil encontrar candidatos melhores que um pastor evangélico e um militante de base de esquerda.

Freixo conseguiu recuperar grande parte dos eleitores de esquerda que haviam se dispersado desde que PT e PDT se juntaram para afundar com Garotinho em 1998. Além de líderes comunitários, sindicalistas e a esquerda universitária, também atraiu eleitores de centro que votariam em um candidato liberal se os liberais brasileiros lembrassem que o "Segundo Tratado sobre o Governo", de Locke, é sobre os direitos dos favelados cujas residências são invadidas sem mandado.

O bom desempenho de Freixo, por outro lado, o trouxe ao ponto em que o PT estava antes de se corromper: na ausência de ofertas em dinheiro, não apareceu muita gente do centro para lá oferecendo apoio. Uma hora o PSOL vai ter que fazer alianças. Tomara que novas regras sobre financiamento e a Lava Jato o ajudem a mantê-las não-remuneradas.

Quanto a Crivella, a primeira coisa a ser dita é que, como seu concorrente no segundo turno, é um sujeito bastante inteligente. Até as denúncias do segundo turno, conduziu uma campanha centrista e razoável, com acenos à direita liberal e até à esquerda. Tanto quanto Freixo, é uma novidade.

A direita evangélica tem uma base popular que a direita liberal não tem, e uma estrutura de formação de quadros que dispensa a multidão de filhos, netos e sobrinhos que povoam a direita brasileira. Na eleição de 2014, o Pastor Everaldo se apresentou como a oposição que não era neto de ninguém (ao contrário de Aécio e Eduardo Campos). Crivella é sobrinho do Bispo Macedo, mas essa é uma dinastia de outra natureza.

Entretanto, quando as revelações sobre seu passado vieram à tona, Crivella reverteu ao repertório tradicional da direita mais tosca, na linha do que diria seu apoiador Bolsonaro (o que teve tontura no debate, não o que vive permanentemente desorientado). E pouca gente duvida que Crivella governará com alguma versão da máquina de sempre da política carioca (como Russomanno, provavelmente, simplesmente assumiria a máquina dos tucanos).

Isso sugere um padrão interessante. Parece ser mais fácil para a direita brasileira eleger suas novidades, mas o risco delas se diluírem nas velhas estruturas talvez seja maior.


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