Folha de S. Paulo


O que determina a capacidade de fazer uma boa negociação?

Você chega em casa de carro novo e mostra a aquisição para a família, feliz da vida. Depois de muito conversar com o vendedor, comprou o veículo por R$ 50 mil. Apesar de o valor ser salgado, você saiu da concessionária satisfeito, tendo em vista que conseguiu alguns opcionais e o preço inicial dado pelo vendedor foi de R$ 55 mil.

Para jogar um balde de água fria em sua satisfação, no domingo você vai à casa de seu cunhado e descobre que ele comprou o mesmo carro - tão completo quanto o seu - por R$ 45 mil. O primeiro pensamento que vem à cabeça é: "eu batalhei tanto para conseguir o desconto, como ele conseguiu fazer isso?".

Nesse caso hipotético, o mais provável é que seu cunhado tenha começado a negociação por um valor bem abaixo do seu. Enquanto para você o vendedor iniciou com um teto de R$ 55 mil —valor que poderia lhe render uma boa margem de lucro—, seu cunhado conduziu a negociação de modo que o teto fosse bem abaixo do seu, o que deu margem para trabalhar um valor melhor.

Durante negociações, somos influenciados pelo que é conhecido como efeito de ancoragem. O psicólogo Daniel Kahneman exemplifica como isso acontece em nossa mente com duas perguntas simples: você acha que Gandhi tinha mais ou menos que 144 anos quando morreu? Que idade tinha Gandhi quando morreu?

Intuitivamente você assume que 144 é uma idade avançada demais e que ele provavelmente não chegou a viver tudo isso, mas você deve ter imaginado uma pessoa muito velha. O número serviu para ancorar sua estimativa mais próxima de uma idade avançada, o que é chamado de priming. O mecanismo é o mesmo quando você negocia um produto, como o exemplo acima.

A quem tiver curiosidade, o filme Focus traz uma cena com um exemplo muito claro de como funciona o efeito de priming. Na trama, o protagonista é um trapaceiro experiente. Em determinado momento, ele mostra como usou a técnica de primar um número para enganar um apostador compulsivo e ganhar muito dinheiro às custas dele.

Quando precisar fechar um negócio, seja autocrítico. Reflita sobre os valores que estão sendo colocados na mesa e observe se você pode estar sendo influenciado por números aleatórios que estão "primados" em sua cabeça. Aprender a controlar bem suas âncoras pode lhe render habilidades como um bom negociador.

Post escrito em parceria com Karina Alves, editora do site Finanças Femininas


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