Folha de S. Paulo


Olhar para a frente

Poderia fazer um longo texto descrevendo as mazelas do setor industrial, que apresentou uma queda de produção acumulada de 4,5% nos 12 meses encerrados em fevereiro. Ou lembrar que a economia como um todo, medida pelo índice IBC-Br, do Banco Central, teve uma retração de 3,16% em fevereiro na comparação com o mesmo mês do ano passado. Mas isso é o passado. O Brasil e os brasileiros estão precisando olhar para a frente.

Há motivos para esperar que as condições da economia brasileira melhorem significativamente a partir do terceiro e quarto trimestres pelas razões que enumero a seguir.

O ajuste fiscal está em andamento, e, a esta altura, é muito difícil encontrar alguém que levante dúvidas sobre a disposição do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, de levar adiante seu programa nessa área. A inflação, embora ainda alta, tende a recuar com a diluição do impacto do aumento de tarifas públicas. O câmbio mantém uma trajetória benigna, nem tão desvalorizado para complicar a política anti-inflacionária nem tão valorizado a ponto de prejudicar a atividade exportadora.

No mercado financeiro, um olhar atento para a frente revela que a Petrobras, empresa importantíssima para a atividade econômica do país, tem tudo para sair de seu inferno astral. Com a expectativa da publicação do balanço auditado amanhã ou nos próximos dias, as cotações de suas ações já subiram significativamente, ao mesmo tempo em que analistas voltam a recomendar a compra de bônus externos da empresa.

Olhando para a frente, portanto, é obrigatório observar que o efeito Petrobras, que pressionou a economia para baixo nos últimos meses, vai agora impulsioná-la no sentido contrário, com a reativação de investimentos paralisados pela crise da Operação Lava Jato. Desde que assumiu a atual diretoria, em fevereiro, a estatal já fechou a contratação de financiamentos internos e externos de quase R$ 30 bilhões, que lhe garantem os recursos necessários para a operação deste ano.

Joga a favor da melhoria das condições da economia brasileira o momento de farta liquidez internacional com juros baixos, o que reduz eventuais preocupações das empresas com o financiamento de suas operações.

Estatísticas do BC mostram, por exemplo, que, a despeito das turbulências locais, a taxa de rolagem de financiamentos externos das empresas atingiu 106% em fevereiro. Na prática, as companhias têm conseguido captar mais que o necessário para arcar com os vencimentos de suas dívidas externas.

Outro fato favorável é a firme recuperação da economia americana, tendência realçada na reunião de primavera do FMI, no fim de semana passado. O crescimento dos EUA pode ter impacto importante nas exportações brasileiras de manufaturados, como já se constata nas estatísticas de comércio exterior entre os dois países.

Na área internacional, há ainda o fator China. Acabou, pelo menos por enquanto, o tempo do tradicional ritmo chinês de dois dígitos, mas a economia do gigante asiático continuará com certeza crescendo a uma taxa de pelo menos 7% ao ano. Garantia explícita sobre isso foi dada pelo próprio primeiro-ministro chinês, Li Keqiang.

Em uma incomum entrevista à imprensa internacional, ele passou a mensagem de que a China vai manter seus compromissos para manutenção da ordem mundial. E prometeu trabalhar com outros países para aquecer a economia global. Dado o alto grau de controle governamental sobre a economia chinesa, declarações como essa servem para afastar possíveis previsões sobre um desaquecimento ainda maior da atividade na China.

Por último, é bom lembrar que o Brasil, embora viva sua crise de confiança, mantém um enorme mercado consumidor, que pode ser estimulado. Pela lógica, a melhora das contas públicas, por meio do ajuste fiscal, deve dar ânimo ao BC para abrandar o arrocho monetário e reduzir juros. Ao mesmo tempo, uma nova política de investimentos em infraestrutura, principalmente por meio de concessões públicas, e medidas destinadas a devolver competitividade à indústria podem jogar adrenalina na economia.

É o que se espera, para que o impacto do atual momento de crise não atinja ainda mais o emprego nem ameace os ganhos sociais obtidos a duras penas nos últimos anos.


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