Tarde de sábado na Lapa, Rio de Janeiro. Estamos com amigos no Bar Brasil, um dos restaurantes mais tradicionais da cidade. Fundado em 1907, serve comida alemã farta e muito boa, além de um dos chopes mais festejados do Rio.
O lugar parece parado no tempo: decoração simples, pé-direito alto, e garçons veteranos. Somos atendidos por um velhinho simpático. Há 25 anos, quando eu trabalhava em um jornal no bairro e frequentava muito o Bar Brasil, ele já estava lá.
Pedimos "kassler", mix de salsichões e língua à milanesa, tudo acompanhado por salada de batata. De entrada, o imperdível patê de vitela com pão preto. O garçom anota os pedidos, dá uma olhada no caderninho e diz: "Amigo, é muita coisa. Vai sobrar batata. Não quer pedir uma salada a menos?".
Que coisa rara: um garçom que pensa mais no bolso do cliente do que no seu. Diminuir o pedido significa reduzir a conta e, por consequência, a taxa de serviço. Comovidos, aceitamos a dica. E o sujeito tinha razão. Era comida demais.
Os pratos estavam deliciosos. De sobremesa, rachamos uns "apfelstrudel" com creme. Nos esbaldamos. Depois de quase duas horas de ótima comida, pedimos a conta.
Alguns minutos depois, um gerente chega à nossa mesa. Constrangido, conta que perdeu nosso pedido. "Vocês lembram o que pediram? Digam que eu faço a conta."
Se fôssemos "espertos", poderíamos ter poupado. Bastaria não citar um ou dois pratos ou "esquecer" alguns chopes. Tenho certeza que existe gente assim. Mas em nenhum momento o gerente desconfiou de nós ou deu a entender que temia ser prejudicado. Sem nos conhecer, nos deu um voto de confiança.
Que beleza poder almoçar num lugar assim, onde as relações humanas são tão simples e transparentes. Um lugar sem garçons com palmtops ou contas informatizadas e à prova de erros. É por isso que volto sempre. E pela comida, claro.