Folha de S. Paulo


Desconhecido, oropouche pode ser o novo vírus a preocupar o país

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_Culicoides paraensis_, conhecida como maruim, responsável pela transmissão do oropouche
Culicoides paraensis, conhecida como maruim, responsável pela transmissão do oropouche

Um vírus que costuma circular entre preguiças e outros bichos da floresta tropical está no topo da lista dos que podem acabar causando problemas sérios de saúde pública no Brasil. Para Luiz Tadeu Moraes Figueiredo, virologista da USP de Ribeirão Preto, é preciso ficar de olho no vírus oropouche, cujos sintomas lembram os da dengue.

Figueiredo apresentou os dados mais recentes sobre o patógeno, também conhecido pela sigla Orov, durante a reunião anual da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), que acontece em Belo Horizonte.

"Como diz o Adoniran Barbosa, o que os olhos não veem, o coração não sente", brincou o pesquisador, referindo-se à relativa falta de acompanhamento sistemático do Orov. "A semelhança com a dengue provavelmente faz com que a gente não tenha a real dimensão da presença do vírus por aí", diz Figueiredo, para quem o oropouche tem "grande potencial" para se tornar um problema emergente de saúde pública no país.

CONFORME O FIGURINO

Estudos mais cuidadosos, porém, estão mostrando que essa visão é otimista demais, e que o vírus pode acabar seguindo o figurino de doenças emergentes do passado que acabaram se tornando uma dor de cabeça permanente para a saúde pública do Brasil, como a dengue e a zika.

Em primeiro lugar, o principal inseto responsável por transmitir o oropouche é a mosquinha sugadora de sangue Culicoides paraensis, conhecida como maruim, que tem ampla distribuição pelo território nacional, apesar do nome científico "paraense".

O C. paraensis se multiplica com facilidade em ambientes urbanos, graças aos mesmos fatores básicos que favorecem a presença constante do Aedes aegypti : acúmulo de água em recipientes.

Levantamentos realizados em Manaus revelaram que mais de uma centena de pacientes com sintomas semelhantes aos de dengue ou zika tinham, na verdade, o Orov em seu organismo (distinguir o oropouche dos outros vírus em laboratório não é difícil porque ele não tem parentesco próximo com eles, apesar dos sintomas similares –ao contrário do que acontece entre dengue e zika).

Além dessa presença do vírus numa das principais metrópoles da Amazônia, ele também já foi detectado, em casos isolados, fora dali –num sagui de Minas Gerais, numa pessoa em Ilhéus (BA) e em macacos de Goiás. "Ele pode emergir a qualquer momento", diz Figueiredo.

Além de "derrubar" a maioria das pessoas com sintomas parecidos com o da dengue, uma proporção pequena de infectados pode ter problemas bem mais sérios: meningoencefalite (inflamação das meninges e do cérebro).

Para o pesquisador da USP, além do monitoramento constante, uma atenção maior ao saneamento básico pode ser um caminho para evitar que o vírus cause estragos mais sérios no futuro.

ROEDORES NA MIRA

Figueiredo e seus colegas também estão acompanhando de perto os possíveis riscos trazidos pelos hantavírus, um grupo de patógenos presente em roedores silvestres que assusta pelo alto índice de mortalidade (no Brasil, o percentual médio de mortes entre infectados é de 39%) quando conseguem entrar no organismo humano.

Há várias formas de hantavírus país afora, e uma das mais temidas é conhecida como Araraquara, com taxa de letalidade de 50%. Há uma relação estreita entre desmatamento e avanço da fronteira agrícola, de um lado, e o aparecimento de casos.

Os roedores silvestres que transmitem os vírus costumam se multiplicar em áreas de ambiente perturbado pela ação humana, e é o contato com o vírus presente nas fezes, na urina e na saliva dos bichos que traz a doença para moradores da zona rural.

A bordo de seu "Hantamóvel", com equipamentos de biossegurança apropriados, os pesquisadores da USP têm identificado as espécies de roedores que carregam os vírus com mais frequência, além de isolar o Araraquara em duas espécies de morcego, uma comedora de frutas e outra sugadora de sangue.

Para Figueiredo, um dos principais caminhos para controlar ambas as ameaças é desenvolver métodos mais rápidos e precisos de diagnóstico, algo no qual sua equipe tem trabalhado.

Isolado pela primeira vez nos anos 1950, em Trinidad e Tobago (o nome do vírus vem de uma região do arquipélago caribenho), o Orov pode ter afetado até meio milhão de pessoas na América tropical ao longo dessas décadas –o número é uma estimativa porque raramente a presença do parasita é confirmada por testes laboratoriais.

Inicialmente, acreditava-se que os casos brasileiros estariam concentrados em pequenas comunidades ribeirinhas da Amazônia, graças ao contato dessas populações com os bichos silvestres que são os reservatórios naturais do oropouche.

Editoria de Arte/Folhapress
COMENDO PELAS BEIRADAS Conheça o vírus Oropouche

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