Folha de S. Paulo


Pesquisadores cobram financiamento e reconhecimento para ciência do país

Em debate sobre ciência e tecnologia realizado na Folha na quarta (29), cientistas que chefiam algumas das principais organizações da área cobraram maior estabilidade nas instituições de pesquisa e não pouparam críticas às universidades públicas.

O evento marcou o lançamento do livro "Um Aprendiz de Quixote" (ed. Verbena, 192 págs., R$ 35), autobiografia do físico Rogério Cezar de Cerqueira Leite, integrante do conselho editorial da Folha.

Além do autor, participaram do debate José Goldemberg, presidente da Fapesp, Luiz Davidovich, presidente da Academia Brasileira de Ciências, e Helena Nader, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). O debate foi mediado por Marcelo Leite, colunista do jornal.

Cerqueira Leite abriu sua fala dizendo que lutou a vida inteira "contra a mediocridade que existe em institutos de pesquisa e universidades". O físico criticou a "estabilidade precoce" dos docentes na carreira universitária e a "democratite aguda" que teria se instalado desde que foram instituídas eleições para reitor.

"Anos antes da eleição, começa um jogo de poder em que todo mundo quer o seu pedacinho", disse. "É preciso reduzir a burocracia imensa gerada pela 'democratite', uma doença boa, mas que não funciona num sistema que tem que dar valor para o talento e não para os favores."

A biomédica Helena Nader, da SBPC, disse que é importante mexer na estrutura administrativa das instituições, mas que isso precisa estar casado com um fluxo contínuo de financiamento. Ela aponta que flutuações no orçamento de pesquisa estão entre os fatores que mais prejudicam o avanço da ciência, apontando a Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) como uma das poucas ilhas de estabilidade.

"Cobra-se que o Brasil seja a Coreia. Basta dar o dinheiro e eu vou ser. Projetos estruturantes estão sendo ameaçados porque [o financiamento] não tem continuidade."

O físico Luiz Davidovich, da UFRJ, mencionou seu Estado como exemplo negativo na ciência. "Lá há laboratórios de biologia que não podem mais importar insumos."

Ex-reitor da USP (1986-1990), José Goldemberg disse que é necessário institucionalizar a ciência no país. A USP seria o melhor exemplo disso, graças ao orçamento assegurado. Ele lamentou, porém, que as universidades não tenham um teto para gastos com pessoal. "Autonomia orçamentária é para adultos. Aposto que as federais não querem esse regime."

Para os debatedores, ainda falta reconhecimento da atividade por parte da sociedade. "A maioria não percebe o papel estruturante da ciência e tecnologia na construção do país", disse Davidovich.

Cerqueira Leite disse que os jornais dão pouca importância à área, mas porque o público não pede. "Nós, cientistas, temos a obrigação de atrair o interesse das pessoas."


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