Folha de S. Paulo


Mutação em gene pode ter ajudado cérebro humano a ficar gigantesco

SPL
Mutação pode ter acontecido há 500 mil anos
Mutação pode ter acontecido há 500 mil anos

Uma mutação aparentemente insignificante no DNA dos ancestrais da humanidade pode ter contribuído para que nosso cérebro alcançasse o tamanho descomunal que tem hoje (três vezes maior que o dos grandes macacos).

Bastou inserir o gene que contém essa mutação em fetos de camundongo para que dobrasse o número de células que dão origem aos neurônios do córtex, a área cerebral mais "nobre".

A pesquisa, conduzida por cientistas do Instituto Max Planck (Alemanha), é um dos primeiros frutos da tentativa de usar o genoma para entender como a evolução humana se desenrolou. Por enquanto, isso não tem sido fácil –tanto que o gene analisado pelos pesquisadores no novo estudo, designado pela indigesta sigla ARHGAP11B, é o único específico da linhagem humana a ser associado com a proliferação das tais células do córtex cerebral.

"Ainda não sabemos qual o mecanismo que leva a essa proliferação aumentada", disse à Folha o coordenador do estudo, Wieland Huttner.

O certo é que parece haver um efeito direto da presença do gene sobre as chamadas BPs (progenitoras basais, na sigla inglesa). As BPs possuem uma vantagem importante quando a questão é produzir mais e mais neurônios: elas ficam numa região do cérebro em desenvolvimento em que há bastante espaço. Com isso, conseguem se multiplicar mais, conduzindo, portanto, a um aumento mais vigoroso do órgão.

Desde quando esse fenômeno acontece no cérebro dos membros da linhagem humana? "A mutação deve ter acontecido antes de 500 mil anos atrás", diz Huttner –isso porque ela não é exclusiva do DNA dos seres humanos modernos.

Os colegas do pesquisador Max Planck estão entre os responsáveis por resgatar o genoma de dois parentes extintos da nossa espécie, os neandertais e os denisovanos. Ao desvendar o DNA completo de ambas as espécies, os cientistas identificaram o gene ARHGAP11B –mas nada de encontrá-lo em outros primatas ou mamíferos.

Segundo o pesquisador alemão, uma possibilidade é que essa mutação tenha acontecido no DNA do Homo erectus, primeiro ancestral do homem a ter passado por um grande aumento de sua capacidade cerebral. O estudo saiu na revista especializada "Science Advances".

SE MACACOS FALASSEM

Na mesma edição da revista, outro estudo pode ter resolvido uma polêmica antiga: será que macacos são capazes de falar?

Por incrível que pareça, a resposta é sim –ao menos quando se examina o aparato vocal dos bichos, ou seja, as pregas vocais, a língua e o formato da boca.

Até hoje, ninguém conseguiu fazer com que chimpanzés ou outros primatas dominassem os rudimentos da linguagem falada humana (embora alguns desses macacos tenham aprendido elementos da linguagem de sinais).

O debate que havia em torno do assunto era o seguinte: essa incapacidade se deve à falta de flexibilidade do aparato vocal das criaturas ou aos seus cérebros mais rudimentares que os nossos, que não lhes permitem controlar a emissão de sons de forma tão sofisticada quanto o homem?

William Tecumseh Fitch, americano que trabalha na Universidade de Viena, resolveu tentar sanar essa dúvida fazendo filmes em raios X do crânio e pescoço de macacos-resos conforme eles realizavam suas atividades diárias –emitindo sons, comendo e bebendo, brigando etc. Isso deu a Fitch e seus colegas uma grande quantidade de dados sobre como o aparato vocal dos bichos funcionava.

Depois, esses dados foram transferidos para uma simulação de computador, que usou os movimentos naturais da boca, da garganta e dos dentes dos macacos para produzir sons sintetizados, mas realistas.

Resultado: os órgãos dos primatas parecem, de fato, ser capazes de produzir cinco vogais similares às humanas –e a pronunciar a singela frase inglesa "Will you marry me?" ("Quer casar comigo?").Os cientistas concluem que os resos poderiam ser capazes de falar –bastaria que eles fossem um tanto mais espertos do que um macaco comum.


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