Folha de S. Paulo


Clube de viagens para idosos quer acabar com a solidão e o isolamento

Domnick Walsh/Eye Focus
Mary e seu marido, Barry Fairtlough, receberam hóspedes duas vezes como parte do projeto Freebird; os filhos deles se mudaram e hoje eles compartilham da casa onde moram com outros
Mary e seu marido, Barry Fairtlough, receberam hóspedes duas vezes como parte do projeto Freebird; os filhos deles se mudaram e hoje eles compartilham da casa onde moram com outros

O consumo colaborativo é movido principalmente por pessoas da geração Y e voltada a elas, mas existe um clube peer-to-peer que visa atrair a geração mais velha para o sistema e, ao mesmo tempo, propor uma saída para um problema social.

A ideia do FreeBird Club surgiu quando Peter Mangan começou a alugar sua casa no condado de Kerry, na Irlanda, pelo Airbnb. Seu objetivo era ganhar um pouco de receita adicional com a casa, mas foi seu pai, veterinário aposentado que cuidava da casa enquanto Mangan estava trabalhando em Dublin, quem acabou se beneficiando mais. "Meu pai estava com 70 e poucos anos. Ele estava sentindo os efeitos de trabalhar menos e de ter ficado viúvo", contou Mangan. Mas receber e saudar hóspedes que ficavam na casa lhe infundiu ânimo novo. "Houve alguns casais mais velhos que vieram ficar na casa, e eles se deram bem imediatamente. Ele ia ao pub à noite com os casais, foi convidado para jantar na casa, jogaram golfe juntos e ele levou os casais para fazer um pouco de turismo."

Assim nasceu o FreeBird Club. "Achei que era algo do qual o Airbnb estava apenas arranhando a superfície", falou Mangan. "Se você intensificar o lado social da coisa e fizer da experiência uma maneira de conhecer outras pessoas, e não apenas de encontrar um lugar simpático para se hospedar, dá para suavizar alguns dos problemas das pessoas mais velhas." A solidão e o isolamento são problemas enormes para as pessoas mais velhas, especialmente após a morte de um cônjuge. "A solidão é um verdadeiro flagelo da sociedade", disse Mangan. Ele achou que o consumo colaborativo poderia ter o potencial de ajudar a reduzir esse problema social.

Mangan foi aceito como participante de um programa incubador, o Impact Hub Fellowship for Longer Lives, fazendo pesquisas e organizando grupos de discussão sobre a proposta. As pessoas mais velhas com quem ele conversou disseram que "gostariam de viajar mais, mas sentem que não têm essa opção, especialmente se estão sozinhas ou perderam um companheiro". Diferentemente do Airbnb, o FreeBird Club requer que os anfitriões estejam presentes. O anfitrião não pode apenas alugar uma casa vazia -a interação social é uma parte tão importante do programa quanto a oferta de hospedagem.

Preocupações de segurança são outro fator importante para as pessoas com quem Mangan conversou, e isso fomentou a ideia de um clube onde quem quiser participar precisa tornar-se sócio e pagar uma taxa. "Com o Airbnb, as pessoas achavam que qualquer pessoa podia participar, e elas não confiavam nisso. Se fosse um clube tradicional, no qual é preciso pagar para entrar, as pessoas sentiriam mais confiança", ele explicou.

Bethia Tooth foi uma das primeiras hóspedes a participar do piloto do clube FreeBird. Ela viajou de sua casa no Reino Unido para Kerry. Foi sua primeira visita à Irlanda. Apesar de ter chegado ao país no meio da tempestade Desmond, em dezembro passado, ela disse que teve uma estadia "maravilhosa" com anfitriões em Killorglin. "Não é um simples 'bed and breakfast', e foi por isso que eu me interessei tanto por entrar para o clube", ela comentou. "Foi como se uma amiga tivesse me apresentado a amigos dela. Eu contei a eles sobre minha família, eles me contaram sobre a eles, ficamos batendo papo como se fôssemos velhos amigos."

Tooth viajou à Irlanda com uma amiga, mas disse que da próxima vez em que fizer uso do clube ela se sentirá à vontade em viajar sozinha, coisa que até então não teria lhe passado pela cabeça. "Meu marido morreu seis anos atrás. Antes do FreeBird Club, eu não teria imaginado poder viajar sozinha para algum lugar que não conheço", explicou.

O benefício social se estende também aos anfitriões, já que muitos deles são pessoas com a síndrome do ninho vazio (depois de seus filhos saírem de casa), disse Mangan. Mary e Barry Fairtclough foram hóspedes dentro do esquema piloto do FreeBird Club e alugaram um quarto de sua casa em Killorglin. Tiveram dois hóspedes e acharam uma experiência ótima receber pessoas em sua casa. "Nossos filhos estão todos morando no exterior; estamos aposentados, vivemos em um lugar lindo e achamos que seria interessante compartilhar isso com outras pessoas", disse Mary Fairtclough.

Usando o mesmo modelo que o Airbnb, o FreeBird Club permite que anfitriões cobrem uma taxa para hospedar pessoas em sua casa. Não há preços definidos; os anfitriões decidem quanto cobrar. Normalmente é um preço semelhante a um B&B local. O esquema garante uma fonte adicional de renda, algo importante para aposentados que, segundo Mangan, podem passar por dificuldades financeiras. "Muitos aposentados recebem pensões insuficientes. O esquema é uma maneira de monetizar um patrimônio que muitas pessoas mais velhas possuem: sua própria casa, com o financiamento já quitado", ele disse. Mary Fairtclough disse que o dinheiro extra é útil a ela e seu marido e que o esquema lhes permite ganhar um pouco com o espaço ocioso que têm em sua casa. "São algumas libras a mais. As pessoas que vivem de aposentadoria precisam aproveitar ao máximo o que possuem."

O FreeBird Club é uma empresa que atende uma necessidade social, e foi isso que a ajudou a vencer o Concurso Europeu de Inovação Social 2015, promovido pela Comissão Europeia. Mangan disse que a parte comercial é importante para aumentar a eficácia do esquema. "É um empreendimento social dos tempos modernos, uma empresa com fins lucrativos", explicou, dizendo que esse fato ajudará o clube a ter impacto maior. "Para poder crescer, para atrair investimentos, o clube precisa ser rentável." Mas ele enfatiza que o etos de impacto social "está à base do que procuramos fazer".

O FreeBird Club estava previsto para entrar online no início de junho.

Tradução de CLARA ALLAIN

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