Folha de S. Paulo


Cientistas e chefs se debruçam sobre técnicas de fermentação dos alimentos

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Tempeh. FOto: Divulgacao ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
Tempeh, alimento fermentado com um fungo da Indonésia

Micróbios, seres vivos minúsculos que tanto servem para causar doenças como para produzir pão e vinho, estão sendo tratados agora como a mais nova ferramenta dos chefs de cozinha.

"Tão essenciais quanto uma faca ou uma frigideira", afirma a química especializada em sabores Arielle Johnson, em artigo na revista científica "Nature Microbiology".

A fermentação é a transformação de comida por micróbios. Os mais populares desses "microrganismos culinários" são os fungos e as bactérias "do bem" (os micróbios "do mal" ou estragam comida, ou causam doenças como tuberculose e peste bubônica).

"Processos de fermentação controlados são a chave para elaborar iguarias como queijo, chocolate, vinho, pão, molho de soja, iogurte e cerveja", diz Johnson.

Micróbios gourmet

MICROBIOLOGIA

Já o que ela chama de "microbiologia artesanal de alimentos" utiliza técnicas de vários países para realçar sabores -produzindo mais acidez, mais açúcares ou mais compostos aromáticos, por exemplo.

Micróbios, como todo ser vivo, necessitam de uma fonte de alimento e, no processo de se alimentarem para extrair energia, eles transformam bioquimicamente a comida, produzindo essas novas substâncias.

Curiosamente, micróbios parecidos podem produzir comida ou remédios.

É o caso da penicilina, o antibiótico pioneiro, descoberto em 1928. Essa molécula é produzida por fungos do gênero Penicillium. Outras espécies do mesmo gênero são usadas na fabricação de queijos. O caso clássico é o Penicillium roqueforti, usado na produção do queijo francês Roquefort, de sabor intenso e "veias" azuladas.

"Quando você fermenta um alimento, você cria sabor", diz a química, que chefia um grupo de pesquisa conhecido como MAD, que desenvolve um trabalho junto ao restaurante noma, de Copenhague, na Dinamarca.

O noma é uma verdadeira instituição no mundo da culinária internacional. Foi considerado "o melhor restaurante do mundo" pela revista especializada "Restaurant" por diversas vezes, apesar de ter apenas duas estrelas (em vez das três máximas) no clássico guia francês Michelin.

A lista de espera do noma é de meses e os ingredientes são obtidos apenas na região -o "no" no nome do restaurante remete à cozinha nórdica. Os micróbios ajudam a produzir pratos insólitos e a conta é medida em centenas de reais.

Outros restaurantes que estão aderindo ao "Masterchef Micróbio" são o Bar Tartine, em San Francisco (EUA); o Number 9 Park, em Boston (EUA); o Momofuku, em Nova York (EUA); ou Aponiente, em El Puerto de Santa Maria (Espanha).

Os processos de fermentação que ela cita podem vir da Rússia, da China, da Escandinávia, da Coreia ou do Japão. Os japoneses têm uma rica tradição de alimentos fermentados, como o popular molho de soja ou a pasta missô.

"Novas ideias podem vir de fontes inesperadas, como pedidos de patentes sobre processamento de molhos de peixe, anais de congressos em etnobiologia, livros históricos sobre a ciência e a civilização na China, ou artigos de engenharia química sobre a atividade enzimática de fungos. A exploração bem sucedida da microbiologia artesanal requer um gosto pela
autoeducação e o empirismo, bem como o que pode ser melhor descrito como uma intuição cultivada ou talento especial, para criar um conjunto de habilidades", resume a autora do estudo.


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